Jogo de Empurra
Celso Luis
Rodrigues Vegro Os menos avisados imaginam
que tratarei aqui do Monumento As Bandeiras, mas, equivocam-se, pois
meu assunto é mesmo o café, tema com o qual intelectualmente labuto
com o afinco com que Brecheret picou, por 30 anos, o duro granito. As exportações brasileiras
de café no primeiro semestre de 2012 foram recentemente divulgadas
pelo CECAFE. Entre janeiro e junho de 2012 os embarques totais de
café somaram 12,62 milhões de sacas com saldo cambial apurado de
US$3,11 bilhões (Tabela 1). TABELA 1 – Balanço das Exportações, Agronegócio Café, Brasil, Jan.-Jun. de 2010, 2011 e 2012
Fonte: elaboradas a partir
do CECAFE (www.cecafe.com.br). Excetuando-se o preço médio recebido que exibiu um ligeiro incremento (1,1% apenas), todos os demais componentes da balança comercial do café (volume e valor) tiveram pior desempenho na comparação entre os primeiros semestres de 2011 e 2012. Houve forte encolhimento nos embarques de robusta (redução de 67%) e de arábica (menos 20,3%), repercutindo na diminuição na quantidade exportada total de café verde (baixa de 24,7%). Sem dúvida, não há nada para se comemorar diante de tais resultados. Não fosse o café um produto
capcioso e a memória do brasileiro curta, por aqui pararíamos. O
ciclo bienal da cultura não é assunto somente para a classe
agronômica e cafeicultores terem o que falar, mas ao contrário, é
componente que também pauta a dinâmica dos negócios. A
comercialização ocorrida no primeiro semestre de 2012 pertence a um
ciclo de baixa, com menor oferta de produto, devendo, portanto, ser
comparado com período em que o mesmo fenômeno se sucedeu, ou seja, o
primeiro semestre de 2010. Feitas as devidas contas
entre os períodos congêneres houve no primeiro semestre de 2012:
incremento de 7,2% no robusta; queda de 15,2% e 14,3% de no arábica
e na exportação total de verde, respectivamente. Contabilizando
queda também no industrializado (11,4%), a exportação total
reduziu-se em 13,9%. Em contrapartida, as receitas cambiais
elevaram-se em 28,1% e o preço médio foi alavancado em formidáveis
36,9%. No balanço das taxas pode se concluir que o primeiro semestre
de 2012 foi uma temporada melhor para agronegócio café do que o
mesmo período de 2010. O mais significativo
resultado desse exercício foi constatar que se obtiveram tais
resultados mesmo sob o clima macroeconômico de crise financeira
global, enquanto que no primeiro semestre de 2010, o mundo
experimentava nova euforia econômica. Outra informação altamente
relevante para essa análise consiste nos resultados para as
exportações de arábica e robusta de qualidade (gourmet,
certificados, lavados e descascados). O avanço nos embarques de
produto de melhor qualidade é espetacular. Na comparação entre os
dois anos safras de baixa, o incremento das receitas com arábica
aproxima-se da casa do bilhão de dólares e em robusta quase que
triplica (Tabela 2). Na atualidade, os Cafés do Brasil,
particularmente o Bourbon Amarelo e o Cereja Descascado, estão na
mira de grande parte dos torrefadores internacionais. Tais
especialidades se tornaram disputadas e suas cotações mostram-se
crescentes. TABELA 2 – Quantidade, Valor e Preço Médio dos Cafés Diferenciados, Brasil, 2009/10 e 2011/12
Fonte: elaboradas a partir
do CECAFE (www.cecafe.com.br). No período de maio de 2011 e
abril de 2012, a Associação Brasileira da Indústria do Café (ABIC)
contabilizou incremento de 3,05% na demanda por café, ou seja, os
brasileiros passaram a consumir 4,94kg de T&M/ano. A origem de todos
os negócios está na base produtiva agrícola, ou seja, na lavoura de
café. Então esse aumento da demanda interna, confrontado com o ciclo
de baixa, acentuou as diminuições observadas nos embarques. Tal
fenômeno pode ser considerado uma queda para o bem, pois consolida o
vigor do mercado interno e oferece maior transparência nas
transações. Junho de 2012 foi um dos
meses mais chuvosos da história no perímetro dos principais
cinturões cafeeiros do país. As perdas físicas estão sendo
contabilizadas, enquanto as de qualidade foram sacramentadas. Aquela
lorota de safra recorde com acúmulo de estoques até perdeu sua
graça, se é que alguma graça havia. Não tem mais safra recorde
tampouco quantidade suficiente de café de alta qualidade para
abastecer os torrefadores. O único vetor para preços é ladeira acima
e salvem-se quem puder. Pautado naquilo que a
análise até esse momento apresentou, o cenário provável para o
mercado de café apontaria para boas oportunidades de negócios com
preços remuneradores. Entretanto, no atual momento a cafeicultura
volta a patinar, com cotações internacionais recuando para níveis
preocupantes. Assim cabe a pergunta: que elementos poderiam explicar
essa conjuntura? Cogito que tem havido no uma espécie de jogo de empurra. As traders/exportadores (nacionais e internacionais), exageradamente cautelosas quanto à demanda efetiva de seus clientes internacionais, estão adiando os pedidos para o prazo limite de seus embarques. Assumindo essa postura, conseguem uma vantagem derivada que é a de pressionar os preços no mercado físico. Essa razão pode ser, talvez, o verdadeiro fator que tem deprimido as cotações. Momento mais apropriado que
esse para o surgimento de uma política pública de comercialização
não poderia existir. A expertise governamental em opções públicas
deveria ser retomada, sinalizando para todo o mercado que a
autoridade brasileira esta atenta as manobras do mercado e
propõem-se a oferecer opções de venda, a preços de R$450,00/sc a
R$470,00/sc, para entregas em dezembro/2012 e março/2013, por
exemplo. O lançamento de opções públicas para um montante de 2
milhões de sacas (pouco mais – pouco menos) permitiria transposição
menos angustiante por esse período de pouca transparência do
mercado, beneficiando a cafeicultura no curto prazo e de todo o
agronegócio no longo. Que Brecheret tenha sido
gênio de nossa escultura modernista não há duvida, mas quem torneou
o Pensador foi Rodin. O vigor do bronze de punho ao queixo, em
esforço hercúleo de pensamento, produz em quem observa (e também em
quem escreve) conexões sinapses que até mesmo uma mente preparada
fica surpresa. CHEGA DE JOGO DE EMPURRA!
Celso Luis Rodrigues
Vegro é Engenheiro Agrônomo pela Escola Superior de Agricultura
"Luíz de Queiróz" - USP/Piracicaba com especialização em Sistemas
Agrários pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Concluiu
mestrado em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade pela Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro (1992). Atualmente, atua como
Pesquisador Científico nivel VI do Instituto de Economia Agrícola da
Agência Paulista de Tecnologia para os Agronegócios da Secretaria de
Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Dentre as diversas
áreas de estudo, concentram-se de trabalhos em temas ligados à
coordenação de cadeias agroindustriais, inovação tecnológica e
tendências do mercado de alimentos e bebidas, especialmente, do café.
Contato: celvegro@iea.sp.gov.br Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte Dados para citação bibliográfica (ABNT):
VEGRO, C. L. R.; Jogo de Empurra. 2012 Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2012_3/Empurra/index.htm>. Acesso em:Publicado no Infobibos em 31/08/2012 |