Impacto do gênero Cylindrocladium
para diferentes culturas
Christiane Ceriani Aparecido
Danielle Finatti
A utilização de espécies florestais para produção de madeira,
papel e celulose tem se tornado bastante importante no Brasil.
Dentre os gêneros utilizados destacam-se Pinus e Eucalyptus.
Este último, em particular, muito importante no que se refere à
produção de madeira para utilização na indústria de papel e
celulose. Porém, com a intensificação dos cultivos, inúmeros
patógenos têm passado a parasitar as plantas principalmente,
durante os estágios iniciais de desenvolvimento. Várias espécies
de fungos do gênero Cylindrocladium têm se destacado como
parasitos de ambas as espécies florestais levando a problemas
consideráveis em regiões tropicais e subtropicais, devido às
condições ambientais favorecerem o desenvolvimento dos patógenos
que podem causar causar: tombamento de plântulas, podridão de
estacas, estrangulamento do caule, podridão de raízes, manchas
foliares e, em se tratando do gênero Pinus, ainda pode ocorrer
seca dos ponteiros e queima das acículas.
No Brasil, a ocorrência de Cylindrocladium foi primeiramente
constatada na década de 30 sobre plantas de eucalipto
provenientes do Horto Florestal da Cantareira. Posteriormente, o
patógeno foi, também, detectado no Vale do Rio Doce, MG, Costa
do Espírito Santo, Bahia e demais estados nordestinos, região
Amazônica, Santa Catarina, Paraná e São Paulo. Durante cerca de
20 anos, desde sua primeira constatação, o gênero
Cylindrocladium afetava de forma mais expressiva, em particular,
espécies florestais. Porém, já em 1967, foi detectada
Calonectria quinqueseptata, forma teleomórfica de
Cylindrocladium quinqueseptatum, sobre a espécie frutífera
Annona squamosa (fruta do conde). Recentemente, plantas
ornamentais, como o lírio da paz e heliconia têm sido
infectadas. Também, em outros países como Estados Unidos,
Itália, França, Bélgica e Holanda, algumas espécies já foram
constatadas tanto em plantas ornamentais como em outras culturas
de importância econômica, pertencentes às mais variadas famílias
botânicas.
Além das espécies florestais, plantas como a espécie frutífera
Annona squamosa, Cassia fasciculata (Leguminosae), o amendoim (Arachis
hypogea – Leguminosae), cevada, aveia, centeio, trigo e soja já
foram reportadas como hospedeiras de diferentes espécies do
gênero Cylindrocladium, de acordo com pesquisas realizadas desde
1967.
Outra planta recentemente infectada por Cylindrocladium é Acacia
mearnsii (acácia-negra). Esta é uma espécie florestal
proveniente da Austrália, cuja madeira é utilizada no Rio Grande
do Sul para obtenção de energia, celulose, papel e chapa de
fibra. Porém, sua maior relevância econômica está na casca,
matéria-prima a partir da qual é obtido tanino.
Este trabalho apresenta uma descrição dos fungos pertencentes ao
gênero Cylindrocladium, bem como das doenças causadas, uma vez
que as condições climáticas e a diversidade de espécies
hospedeiras no Brasil favorecem o desenvolvimento do patógeno.
Sintomatologia
Em eucalipto, diferentes doenças podem ser causadas por
patógenos do gênero Cylindrocladium, entre as quais: mancha de
folhas, podridão de estacas e tombamento de mudas. Em outras
espécies pode ocorrer a podridão do colo.
A podridão de estacas é bem característica, tratando-se de uma
lesão escura que progride da base para o ápice da estaca. A
podridão pode estar localizada na região da interface
estaca/substrato ou em porções superiores da estaca. A lesão
avança sobre os tecidos da estaca, escurecendo-a por completo,
provocando a morte das gemas e impedindo o enraizamento. Algumas
vezes, é possível observar, também, frutificações do patógeno.
Quando se trata de C. crotalariae, também se verifica a presença
de estruturas pertencentes à fase teleomórfica, o ascomiceto
Calonectria crotalariae, tanto sobre folhas de eucalipto como
sobre folhas de outros vegetais já em decomposição.
O tombamento pode afetar as plantas nas fases de germinação
(pré-emergência) ou de plântulas (pós-emergência) atacando os
tecidos tenros da radícula e do caulículo. O sintoma típico da
doença caracteriza-se pelo surgimento de uma lesão na região do
colo da plântula, a qual pode atingir tamanhos variáveis no
caulículo. Apresenta, inicialmente, um aspecto encharcado,
causando uma depressão na área e depois adquirindo coloração
escura, resultante da necrose dos tecidos. A destruição dos
tecidos acaba provocando o tombamento da plântula e a sua morte
(Figura 01).
Figura 01 – Tombamento de plântula de eucalipto em decorrência
da infecção por Cylindrocladium.
Outra doença causada em eucalipto por espécies de
Cylindrocladium é a mancha das folhas (Fig. 02). No Brasil, esta
é uma doença bastante comum no campo, observada em plantas de
qualquer idade. Porém, torna-se mais importante ao infectar
plantas que se encontram no estádio fenológico B, caracterizado
pela não ocorrência da desrama natural das plantas. As
principais espécies de eucalipto hospedeiras de Cylindrocladium
sp são: E. acmenioides, E. alba, E. camaldulensis,
Corimbea
citriodora (=E. citriodora), E. dunnii,
E. paniculata, E.
pellita, E. saligna, E. cloeziana, E. grandis e
E. urophylla. É
importante salientar que as três últimas são as mais
suscetíveis. Os sintomas causados pela doença caracterizam-se
por manchas de forma e coloração variáveis, o que irá depender
de vários fatores como: espécie de eucalipto, espécie de
Cylindrocladium e também condições ambientais. Pode ocorrer
intensa desfolha, sendo que os brotos não são atingidos, o que
favorece a recuperação das plantas quando as condições
ambientais já não favorecem a ocorrência do patógeno. A presença
do patógeno pode também ser observada em ramos, na forma de
lesões necróticas escuras recobertas por estruturas de coloração
esbranquiçada.
Figura 02 – Mancha de folhas em eucalipto causada por
Cylindrocladium.
Também pode ocorrer a podridão de colo e raízes, sendo que as
plantas infectadas apresentam amarelecimento de toda a copa,
sendo que neste estágio grande parte das raízes já está
comprometida (Fig. 03). Posteriormente, ocorre a morte do
hospedeiro.
Figura 03 – Plantas de lírio-da-paz (podridão de colo e raízes).
A → sadia. B → infectada por Cylindrocladium sphatiphylli. C →
Plântula de eucalipto infectada por Cylindrocladium scoparium já
na fase final da doença.
Agente causal
O gênero Cylindrocladium agrupa, em média, 33 espécies e, no
Brasil, já foram constatadas as seguintes espécies:
Cylindrocladium clavatum, C. pteris, C. theae,
C.
quinqueseptatum, C. floridanum, C. crotalariae,
C. scoparium
(ampla distribuição mundial), C. ilicicola e C. candelabrum.
Mais recentemente, foi relatado pela primeira vez C.
spathiphylii sobre Spathiphyllum, planta ornamental originária
da América Central e conhecida vulgarmente como lírio da paz.
Quando se trata do gênero Eucalyptus, em que ocorre o tombamento
de mudas, as principais espécies patogênicas envolvidas são: C.
scoparium e C. clavatum. Durante a década de 60, a doença
causava sérios prejuízos, principalmente devido ao manejo das
sementeiras. A partir de 1971, com as mudanças no manejo aliadas
às medidas de controle estabelecidas desde 1967, houve certa
diminuição na incidência da doença. Além do tombamento de mudas,
C. clavatum, C. crotalariae e C. scoparium foram detectados
causando podridão de estacas de eucalipto.
Com relação a outras espécies florestais, em 1969 nos estados do
Paraná e São Paulo, foi constatado Cylindrocladium clavatum
causando podridão de raízes em árvores de Araucaria angustifolia,
com mais de dez anos de idade. Em Pinus a doença ocorre desde o
Paraná até a Bahia, incluindo também o estado de Goiás e atinge
árvores a partir de um ano de idade. A podridão de raízes em
Pinus, assim como em A. angustifolia foi descrita em 1972 sendo
a patogenicidade confirmada em 1979.
Em 1995 foram identificados como hospedeiros de Cylindrocladium
colhounii: Eucalyptus robusta, Callistemon citrinus (mirtácea
ornamental), Ilex paraguayensis (erva-mate), Arachis hypogea,
Annona squamosa e Phellodendron amurense (ornamental).
No Havaí e Flórida, nos Estados Unidos, foi constatado C.
spathiphylii sobre Heliconia, Spathiphyllum,
Strelitzia nicolai
e Ludwigia palustris, todas plantas ornamentais. Porém, durante
as épocas quentes e úmidas, a planta é severamente infectada por
C. spathiphylii, o que passa a ser um fator limitante à expansão
da cultura. Mais recentemente no Brasil, este patógeno também
foi constatado sobre Spathiphyllum. No Pará foi constatada a
ocorrência de C. parasiticum sobre mogno africano (Khaya
ivorensis) e ipê-marelo (Tabebiuia serratifolia), ambas espécies
florestais bastante utilizadas para reflorestamento na Amazônia.
Esta foi a primeira constatação de C. parasiticum sobre mogno
africano e ipê-amarelo no País.
A identificação das espécies, geralmente, é realizada com base
nos caracteres morfológicos dos conídios (tamanho e número de
septos) e no formato das vesículas terminais. Porém, alguns
autores, já identificaram variação na forma das vesículas dentro
de um mesmo isolado, resultado este de variação no substrato
e/ou idade da cultura (Fig. 04 – A, B, C, D e E). Sendo assim,
alguns autores acreditam que este não seja um carácter muito
confiável a ser considerado em estudos taxonômicos. Quando
cultivado em meio artificial, Cylindrocladium spp. apresenta
colônias de coloração marrom-castanha (Fig. 04 – F e G) e de
crescimento rápido, sob temperaturas elevadas.
Figura 04 – Características micro e macroscópicas de
Cylindrocladium. A-E → Variação morfológica das vesículas
terminais. F-G → Colônias com coloração marrom-claro a
marrom-avermelhado.
Epidemiologia
O gênero Cylindrocladium agrupa parasitas facultativos que,
devido à capacidade de produzir microescleródios, tanto em meio
de cultura artificial, como no solo e sobre os hospedeiros,
sobrevivem às mais adversas condições ambientais. As estruturas
infectivas germinam e, penetram diretamente no tecido do
hospedeiro, não necessitando da existência de ferimentos. Nas
regiões tropicais e subtropicais o patógeno apresenta maior
importância devido às condições de elevadas umidade e
temperatura que encontra. Segundo dados de literatura,
temperaturas variando entre 120 a 330C são propícias ao
desenvolvimento das inúmeras espécies do patógeno, sendo que
270C é a temperatura mais apropriada. Com relação à dispersão,
quando se trata da fase teleomórfica representada pelo gênero
Calonectria (Fig. 05 – A e B), os insetos são muito eficientes
porque, pela abertura dos peritécios, exsudam substâncias
mucilaginosas juntamente com as estruturas infectivas. Já, as
estruturas anamórficas, representadas pelos conídios de
Cylindrocladium (Fig. 05 – C e D), são eficientemente dispersas
pela água e/ou vento.
Figura 05 – Estruturas reprodutivas do teleomorfo Calonectria (A
- peritécios e B - esporos) e do anamorfo Cylindrocladium (C -
Conidióforo e D – conídios).
Com relação às medidas de manejo e controle recomenda-se o uso
de sementes, substrato e água de irrigação livres de patógenos;
utilização de substratos que possibilitem drenagem adequada;
adubação equilibrada de mudas; utilização de variedades
resistentes quando disponíveis; aplicação de produtos químicos
registrados para a cultura, conforme as recomendações dos
fabricantes.
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Origem: Instituto Biológico -
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Christiane Ceriani Aparecido (christianeceriani@biologico.sp.gov.br)
Danielle Finatti
Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Vegetal,
Instituto Biológico
Av. Cons. Rodrigues Alves, 1252, Vila Mariana, São Paulo, SP,
04014-002.
Reprodução autorizada desde
que citado a autoria e a fonte
Dados para citação
bibliográfica(ABNT):
APARECIDO, C.C.; FINATTI, D. Impacto do
gênero Cylindrocladium para diferentes culturas.
2012. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2012_2/cylindrocladium/index.htm>.
Acesso em:
Publicado no Infobibos
em 13/06/2012
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