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Agregação de valor nas exportações no período 1997-2010: São Paulo agrondustrial-exportador num Brasil primário-exportador

 José Sidnei Gonçalves
José Roberto Vicente

No período 1997-2010 as exportações de produtos básicos dos agronegócios paulistas saltam de patamar, saindo de pouco mais de US$ 1,0 bilhão no período 1997-2002, para níveis superiores a US$ 2,6 bilhões no biênio 2004-2005 e atingindo US$ 3,60 bilhões em 2008. Na crise econômica recua para US$ 2,85 bilhões em 2009, mas volta ao patamar de US$ 3,58 bilhões em 2010 (Figura 1).

Quando são considerados os produtos processados, os valores das vendas externas dos agronegócios paulistas são maiores, tendo evoluído de patamares em torno dos US$ 5,0 bilhões no período 1997-2002 para níveis muito mais elevados, acima de US$ 13,38 bilhões em 2008, embora tenham recuado para US$ 12,38 bilhões em 2009, volta a crescer atingindo US$ 16,62 bilhões em 2010 (Figura 2).

Em função desses indicadores, os agronegócios paulistas apresentam uma baixa participação dos produtos básicos na pauta de exportações. Excetuando-se o ano 2004, quando o câmbio impulsionou as exportações paulistas de grãos, em todos os demais anos do período 1997-2009, tem-se proporções de produtos básicos em torno de um quinto (20,0%). Nos anos recentes há crescimento da participação dos produtos básicos de 17,42% em 2006 para 21,19% em 2008, mas com novo recuo para 17,72% em 2010 (Figura 3).

Isso em decorrência da condição agroindustrial exportadora dos agronegócios paulistas, uma vez que quatro quintos (80,0%) das exportações setoriais do período 1997-2008 foram de produtos com agregação de valor por transformação agroindustrial. Entretanto, nos últimos anos nota-se um recuo da participação de produtos processados de 82,58% em 2006 para 78,81% em 2008, mas retorna ao patamar anterior com 82,28% em 2010 (Figura 4).

Quando se avalia o comportamento das exportações dos agronegócios brasileiros, verifica-se que as vendas de produtos básicos, que eram de US$ 11,20 bilhões em 1997, recuaram para US$ 8,63 bilhões em 1999, face à sobrevalorização cambial do período. Desse ano em diante apresentaram vertiginoso processo de expansão atingindo US$ 39,83 bilhões em 2008, conquanto tenham recuado para US$ 37,64 bilhões em 2009, como decorrência da crise mundial que afetou o comércio exterior desde a segunda metade de 2008, mas volta a mostrar ganho significativo ao atingir US$ 42,02 bilhões em 2010 (Figura 5).

Em termos de produtos processados, os incrementos foram  expressivos, uma vez que de US$ 13,77 bilhões em 1997 atingiu-se US$ 36,31 bilhões em 2008, patamar esse que recua para US$ 29,92 bilhões em 2009, mas que cresce para US$ 37,94 bilhões em 2010 (Figura 6).

Em termos percentuais, as vendas externas de produtos básicos dos agronegócios brasileiros, não apenas são muito superiores aos verificados para o caso paulista, como são crescentes indo de 44,86% em 1997 para 55,71% em 2009, ajustando para 52,55% em 2010 . Nota-se de forma nítida que nos anos recentes as exportações setoriais brasileira reforçam a condição histórica de nação primário-exportadora, ou seja, as vendas externas não consistem num processo que reforce a difusão de agroindústrias multiplicando a renda e o emprego no mercado interno (Figura 7).

 

Essa expressiva participação dos produtos básicos faz com que as vendas de produtos processados, cujos percentuais cresceram de 55,14% em 1997 para 60,17% em 1999, passem a constituir tendência de queda persistente, atingindo 44,29% em 2009, voltando ao patamar de 47,45% em 2010, o que confirma o argumento de que a inserção mais recente dos agronegócios brasileiros no mercado internacional deu-se pela maior expansão das vendas de produtos básicos (Figura 8).

Isso deriva de que as exportações das demais unidades da federação concentram-se em produtos básicos as quais, após recuarem de US$ 9,90 bilhões em 1997 para 7,51 bilhões em 1999, ganham notável dinamismo para alcançarem US$ 36,22 bilhões em 2008, conquanto tenham recuado para US$ 34,04 bilhões em 2009, voltam a avançar para US$ 38,44 bilhões em 2010 (Figura 9).

Já nos produtos processados, após manutenção no patamar de US$ 8,70 bilhões entre 1997 e 2001, também ocorre expansão expressiva alcançando US$ 22,93 bilhões em 2008. Em 2009 esse perfil de agregação de valor nas exportações recuou para US$ 17,54 bilhões, mas voltou a crescer para Us$ 21,32 bilhões em 2010 (Figura 10).

Em termos proporcionais, há uma nítida prevalência dos produtos básicos nas exportações dos agronegócios das demais unidades da federação, indicador que após recuar de 53,21% em 1997 para 47,79% em 2000, cresce de forma significativa para atingir 67,46% em 2009 e realiza ajuste para 64,32% em 2010  (Figura 11).

Com os produtos processados, após crescimento de 46,79% em 1997 para 52,21% em 2000, há o expressivo recuo para 34,00% em 2009, e aumento para 35,68% em 2010 (Figura 12). Configura-se assim a realidade primário-exportadora verificada no conjunto das outras unidades da federação brasileira quando se exclui São Paulo.

A análise dos indicadores acima apresentados mostra algumas diferenciações estruturais relevantes no movimento das exportações brasileiras. Numa leitura nacional, nota-se não apenas uma realidade primário exportadora, como também fica patente o fato de que os anos recentes vem reforçando essa característica com percentuais cada vez maiores de produtos básicos (Tabelas 1 e 2). Esse desempenho ocorre na contramão da leitura de desenvolvimento de tradição cepalina que preceituava o aprofundamento do processo de industrialização, o que em economias continentais como a brasileira implicaria na multiplicação de agroindústrias. Um dos elementos fundamentais para estimular esse processo consiste na denominada “Lei Kandir”  (Lei Complementar n° 87 de 13 de dezembro de 1996) que desonera as vendas externas de produtos básicos mas mantêm a tributação de produtos processados, num nítido tratamento de desestímulo às exportações de produtos processados.

 

Tabela 1- Agregação de Valor nas Exportações dos Agronegócios, Brasil, São Paulo e demais Unidades da Federação, 1997 – 2010

 

(US$ bilhões)

 

Brasil

 

São Paulo

 

Demais Unidades da Fed.

Ano

Básicos

Proc. (1)

Total

 

Básicos

Proc. (1)

Total

 

Básicos

Proc.(1)

Total

1997

11,20

13,77

24,96

 

1,30

5,06

6,36

 

9,90

8,70

18,60

1998

9,27

13,78

23,05

 

0,94

5,26

6,20

 

8,33

8,52

16,85

1999

8,63

13,04

21,66

 

1,12

5,09

6,21

 

7,51

7,95

15,46

2000

8,82

12,96

21,78

 

1,02

4,44

5,46

 

7,80

8,52

16,32

2001

11,18

13,83

25,01

 

1,13

5,06

6,20

 

10,05

8,76

18,81

2002

11,69

14,37

26,06

 

1,32

5,22

6,54

 

10,38

9,15

19,52

2003

14,92

17,51

32,43

 

1,65

6,02

7,67

 

13,27

11,49

24,76

2004

20,20

21,31

41,51

 

2,77

7,27

10,04

 

17,43

14,04

31,47

2005

21,92

24,38

46,30

 

2,71

9,04

11,75

 

19,21

15,34

34,55

2006

22,84

29,20

52,04

 

2,57

12,18

14,75

 

20,27

17,02

37,29

2007

29,82

32,06

61,88

 

3,07

12,45

15,52

 

26,75

19,61

46,36

2008

39,83

36,31

76,14

 

3,61

13,44

17,05

 

36,22

22,87

59,09

2009

37,64

29,92

67,56

 

2,85

13,14

15,98

 

34,79

16,78

51,58

2010

42,02

37,94

79,95

 

3,58

16,62

20,20

 

38,44

21,32

59,76

(1) processados correspondem a semi-manufaturados mais manufaturados.

Fonte:Elaborada pelo IEA/APTA/SAAESP a partir de dados básicos da SECEX/MDIC

 

Tabela 2- Agregação de Valor nas Exportações dos Agronegócios, Brasil, São Paulo e demais Unidades da Federação, 1997 – 2010

 

(em %)

 

Brasil

 

São Paulo

 

Demais Unidades da Fed.

Ano

Básicos

Proc. (1)

Total

 

Básicos

Proc. (1)

Total

 

Básicos

Proc.(1)

Total

1997

44,86

55,14

100,00

 

20,41

79,59

100,00

 

53,21

46,79

100,00

1998

40,21

59,79

100,00

 

15,21

84,79

100,00

 

49,42

50,58

100,00

1999

39,83

60,17

100,00

 

18,01

81,99

100,00

 

48,59

51,41

100,00

2000

40,51

59,49

100,00

 

18,73

81,27

100,00

 

47,79

52,21

100,00

2001

44,70

55,30

100,00

 

18,29

81,71

100,00

 

53,41

46,59

100,00

2002

44,86

55,14

100,00

 

20,11

79,89

100,00

 

53,15

46,85

100,00

2003

46,01

53,99

100,00

 

21,45

78,55

100,00

 

53,61

46,39

100,00

2004

48,66

51,34

100,00

 

27,55

72,45

100,00

 

55,39

44,61

100,00

2005

47,35

52,65

100,00

 

23,06

76,94

100,00

 

55,61

44,39

100,00

2006

43,89

56,11

100,00

 

17,42

82,58

100,00

 

54,36

45,64

100,00

2007

48,19

51,81

100,00

 

19,78

80,22

100,00

 

57,70

42,30

100,00

2008

52,32

47,68

100,00

 

21,19

78,81

100,00

 

61,30

38,70

100,00

2009

55,71

44,29

100,00

 

17,81

82,19

100,00

 

67,46

32,54

100,00

2010

52,55

47,45

100,00

 

17,72

82,28

100,00

 

64,32

35,68

100,00

(1) processados correspondem a semi-manufaturados mais manufaturados.

Fonte:Elaborada pelo IEA/APTA/SAAESP a partir de dados básicos da SECEX/MDIC

 

Noutra leitura da regionalidade das exportações dos agronegócios nota-se as relevantes diferenças estruturais entre os agronegócios paulista e do conjunto das outras unidades da federação, na medida  que, em São Paulo, a parcela expressiva das vendas externas correspondem a produtos processados, enquanto que nas demais unidades da federação prevalecem os produtos básicos (Tabelas 1 e 2). Noutras palavras, uma economia agroindustrial exportadora nas terras paulistas face à condição ainda primário-exportadora das demais regiões brasileiras. Nesse sentido o processo de desconcentração produtiva atingiu a moderna agropecuária mas ainda não alcançou expressão na estrutura agroindustrial de processamento. 

 

Essa territorialidade mostra o equívoco da centralização da capacidade de realizar políticas públicas no Governo Federal, além de que coloca em discussão o sentido do fulcro da política voltada para a expansão da fronteira agropecuária, com intenso uso da guerra fiscal, apoio de políticas federais que não solucionam a realidade de endividamento crescente e que produzem o aumento da dependência externa na importação de fertilizantes. Isso sem contar que todo esse processo de estímulo às vendas externas de produtos básicos acaba por refletir-se na ocupação dos espaços de vegetação nativa nos Cerrados e mesmo na Amazônia. As obras de infra-estrutura que chancelam a expansão realizada sustentando o pretérito processo de acumulação primitiva pelos ganhos patrimoniais da abertura de novas “fazendas” acabam por dar os contornos mais dramáticos à realidade. Esses elementos devem fazer parte da agenda das políticas para um novo ciclo de desenvolvimento da agricultura brasileira.

 

Palavras-chave: agronegócios, balança comercial, exportações, agregação de valor


José Sidnei Gonçalves possui graduação em Engenharia Agronômica pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias de Jaboticabal (FCAJ) da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho-UNESP (1983) e Doutorado em Ciências Econômicas pelo Instituto de Economia (IE) da Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP (1992). Defendeu a Tese de Dotoramento "Mudar para Manter: Pseudomorfose da Agricultura Brasileira" (1997). Atualmente é Pesquisador Científico VI em regime de tempo integral do INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA (IEA) da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA) da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Foca a pesquisa & desenvolvimento na área de Economia Aplicada à Agricultura, com ênfase na Análise do Desempenho Setorial e Políticas Públicas à luz da Teoria Econômica e da História Econômica, abarcando, principalmente, os temas: desenvolvimento economico, orçamento público, instrumentos de políticas governamentais, competitividade setorial, progresso técnico e estrutura de mercado e formação de preços.
Contato:
sydy@iea.sp.gov.br

 

José Roberto Vicente possui graduação em Engenharia Agronômica pela Universidade de São Paulo (1976), mestrado em Ciências (Economia Aplicada) pela Universidade de São Paulo (1989) e doutorado em Economia pela Universidade de São Paulo (1997). Atualmente é pesquisador científico nível 6 do Instituto de Economia Agrícola (IEA-APTA). Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Economia Agrária e Métodos Quantitativos Aplicados, atuando principalmente nos seguintes temas: balança comercial do agronegócio, evolução e determinantes da produtividade agrícola, avaliação de impactos da pesquisa agropecuária.
Contato:
jrvicente@iea.sp.gov.br



Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

GONÇALVES< J.S.; VICENTE, J.R. Agregação de valor nas exportações no período 1997-2010: São Paulo agrondustrial-exportador num Brasil primário-exportador. 2011. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2011_2/AgregacaoValor/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 16/06/2011