Sistema agrossilvipastoril na região sudoeste
Carlos Alberto Flores
Jorge
Ribaski
Vilmar Luciano Matte
Introdução No Brasil, as regiões tipicamente áridas e
semi-áridas, sujeitas à desertificação, se localizam na região
Nordeste do País. Entretanto, no seu extremo meridional, na faixa de
transição entre a zona de clima tropical e temperada, existem
extensas áreas areníticas que vêm sofrendo uma grande pressão
antrópica devido ao aumento dos níveis de utilização, seja através
do avanço da agricultura sem medidas de conservação, seja pelo
excesso na pressão de pastejo por questões tributárias ou
desconhecimento da fragilidade dos ecossistemas naturais onde as
unidades produtivas estão inseridas. Isso tem resultado em
degradação do ecossistema regional, devido à diminuição da cobertura
vegetal, que potencializa o processo de erosão do solo. A área desta
ocorrência alcança uma superfície de aproximadamente dois milhões
(2.003.872) de hectares, abrangendo partes de quinze (15)
municípios, com uma população de 935.034 habitantes.
Contextualização As formações arenosas, características dessa
região, são bastante vulneráveis à erosão eólicas e hídrica e,
atualmente, diversas áreas apresentam importantes núcleos de
arenização (SOUTO, 1994). Por outro lado, os solos originados de
rochas basálticas nesta região, apesar de oferecem melhor rendimento
para as pastagens nativas, caracterizam-se pela pequena espessura,
com uma profundidade efetiva variando entre cinco e cinquenta
centímetros e que, em grande parte, são ocupados por pastagens
degradadas ou em vias de degradação. Como conseqüência identifica-se
extensões de áreas com perdas significativas de espécies da flora
regional (redução da biodiversidade), em especial daquelas de valor
forrageiro. Essas formações arenosas abrangem, principalmente, sete
municípios do estado do Rio Grande do Sul: Alegrete, Cacequi,
Itaqui, Manoel Viana, Quaraí, São Francisco de Assis e São Vicente
do Sul, num total de, aproximadamente,
Trata-se de uma área relativamente plana,
cujos pontos mais elevados não ultrapassam aos Esse tipo de vegetação tem uma participação de
grande relevância na vida socioeconômica dos produtores rurais
devido a exploração de alimento para os rebanhos bovino e de outras
espécies de animais domésticos. No entanto, a baixa aptidão desses
solos para usos mais intensivos e o manejo tradicional da terra, com
a criação extensiva de gado, têm contribuído para aceleração do
processo erosivo, ampliando gradativamente as áreas com vegetação
rarefeita e consequentemente a formação de campos arenizados (Figura
1).
Essa degeneração da qualidade ambiental, com
reflexos negativos nas condições socioeconômicas, tem sido apontada
como uma das principais causas da queda da qualidade de vida do
homem no campo e, consequentemente, do aumento da pobreza nessa
região. Assim, podem-se perceber fortes tendências para mudanças
significativas na forma de uso dos diferentes sistemas de utilização
da terra, aonde os aspectos relativos à sustentabilidade ambiental e
a criação de novas alternativas socioeconômicas vêm assumindo
importância cada vez maior para os produtores dessa região. Atualmente a importância atribuída aos recursos
naturais ganha nova dimensão, principalmente nas relações
internacionais, expressas nos compromissos da Agenda 21 (BRASL,
1996). As instituições ligadas ao tema devem visar o desenvolvimento
sem degradação ambiental, na busca de melhor qualidade de vida e
disponibilidade de recursos e oportunidades, para um permanente
combate às desigualdades sociais. O desafio para reverter essa
situação está na capacidade de a sociedade recuperar e preservar
seus recursos vitais e romper o ciclo de pobreza decorrente da
degradação, abrindo novas oportunidades de empregos e de negócios. Dentro desse contexto, o emprego de sistemas
agrosilvipastoris tem sido visualizado como uma importante
alternativa de uso sustentado da terra, principalmente naquelas
áreas potencialmente sujeitas à degradação e, também, como uma nova
fonte de agregação de valor econômico na propriedade rural, através
da exploração concomitante entre a agricultura, a silvicultura e a
pecuária. Essa iniciativa, inovadora para a região, parece coerente
com as políticas governamentais, que tem como objetivo desenvolver
ações de desenvolvimento atreladas às questões de proteção e de
sustentabilidade ambiental.
Os recursos naturais na região Os solos arenosos da região da Fronteira Oeste
encontram-se na Bacia Sedimentar Fanerozóica, Era Mesozóica, Período
Jurássico e Formações Botucatu, Guará, Sanga do Cabral, Pirambóia e
Rio do Rastro, sendo que nas duas primeiras formações se localizam
as maiores áreas arenizadas na região
(Figura 2).
A Formação Botucatu caracteriza-se por apresentar
arenitos finos a grossos, de coloração avermelhada, grãos bem
arredondados e com alta esfericidade, dispostos em
sets e/ou
cosets de estratificações
cruzadas de grande porte; ambiente continental desértico com
depósitos de dunas eólicas. Já a Formação Guará apresenta arenitos
finos a conglomerático, cores esbranquiçadas a avermelhadas,
intercalados ocasionalmente com níveis centimétricos de pelito;
ambiente continental desértico, com depósitos fluviais, eólicos e lacustres.
Este ambiente caracteriza-se pela fisionomia vegetal
reconhecida como Savana-Estépica, onde há ocorrência dos chamados
areais da Fronteira Oeste do estado do Rio Grande do Sul. Os solos originários destes materiais apresentam
invariavelmente baixa fertilidade e textura muito arenosa, o que os
torna muito vulneráveis à erosão hídrica e eólica. Em virtude destas
características, na maior parte herdada do material que lhes deu
origem, necessitam usos mais adequados, onde se busque produzir,
conservar e preservar para as gerações futuras (Figura 3).
O solo pode ser definido como uma coleção de
corpos naturais que ocupam parte da superfície terrestre e constitui
o meio natural para o desenvolvimento das plantas terrestres. É
dotado de atributos resultantes da diversidade de efeitos da ação
integrada do clima e dos organismos, agindo sobre o material de
origem, em determinadas condições de relevo e durante certo período
de tempo (USDA, 1951). Devido à ação combinada desses fatores de
formação, determinados processos genéticos – adições, perdas,
transformações, transportes seletivos – operam sobre o material de
origem, tendo como resultado a formação de seções mais ou menos
paralelas à superfície do terreno e que se sucedem verticalmente
compondo os solos. Essas seções, denominadas horizontes,
diferenciam-se umas das outras pela organização, pelos constituintes
ou pelo comportamento. Em estudos recentes Ribaski et al (2005), trabalhando numa propriedade rural do município de Alegrete, em um solo Argissolo Vermelho Eutrófico arênico A moderado textura arenosa/média fase relevo suave ondulado, avaliaram o desenvolvimento de um sistema agrosilvipastoril implantado no ano de 2002. O experimento consistia de dois tratamentos básicos, representados por diferentes arranjos espaciais (duas densidades) para a espécie florestal Eucalyptus grandis. E, dois outros tratamentos controle (testemunhas) um para a pastagem nativa e outro representado num florestamento convencional (3m x 3m) (Tabela 1).
Neste sistema
agrosilvipastoril foram utilizadas linhas de plantio triplas, sendo
as fileiras centrais distanciadas entre si em
Santos, et al., (2009), estudando a agregação
do solo sob este sistema, concluiu que em todas as camadas de solo
hà observou-se uma tendência na redução da percentagem de AEA, até a
classe de diâmetro intermediária de agregados (
O estudo ainda revela que uma menor e maior
quantidade de macro e microagregados, respectivamente, foram
apresentadas pelo ELSA. De forma geral, considera-se que o sistema
ELSA foi aquele que promoveu maior degradação estrutural do solo.
Estudos indicam que sistemas de manejo que proporcionem agregados
mais resistentes são desejáveis, pois manterão a estrutura do solo
inalterada. A maior intensidade de utilização do solo pode ocasionar
o fracionamento dos agregados em unidades menores, acelerando o
processo de degradação. Provavelmente a maior degradação encontrada
no sistema ELSA, deva-se ao uso agrícola a que o mesmo foi
submetido. Apesar de ter sido utilizado o sistema plantio direto
para a implantação das culturas e/ou pastagens, este não foi
suficiente para mitigar os efeitos negativos referentes ao manejo
dos solos arenosos.
Mudança de paradigma A região da Fronteira Oeste do estado do Rio
Grande do Sul caracteriza-se hoje por apresentar sérios problemas de
sustentabilidade ambiental, decorrentes em parte da ação antrópica
desajustada à vocação ambiental da região, bem como a conjuntura
econômica global. Hoje, os recursos naturais ganham nova dimensão,
fazendo com que as missões das instituições de pesquisa visem o
desenvolvimento sem degradação, na busca de melhor qualidade de vida
e disponibilidade de recursos e oportunidades para um permanente
combate às desigualdades sociais. Portanto, qualquer plano de desenvolvimento, deve
ser embasado no conhecimento dos recursos ambientais naturais e
sócio-econômicos, para que se possa buscar maior eficiência e
competitividade dos sistemas produtivos, com qualidade de vida e
preservação ambiental. Nesses sistemas as espécies arbóreas têm o
potencial de melhorar os solos. As árvores podem influenciar na
quantidade e disponibilidade de nutrientes dentro da zona de atuação
do sistema radicular das culturas associadas. Pode recuperar
nutrientes localizados em maiores profundidades no solo (abaixo do
sistema radicular das culturas e das pastagens) e reduzir as perdas
por processos como lixiviação e erosão, aumentando a disponibilidade
desses nutrientes, pela sua maior liberação na matéria orgânica do
solo (ciclagem de nutrientes), além de contribuir para a fixação de
carbono (Figura 5 e 6).
A alteração do regime microclimático, induzido
pelo sombreamento das espécies arbóreas, pode provocar diferentes
respostas de caráter produtivo, qualitativo e ecofisiológico nas
espécies presentes no sub-bosque (Ribaski, 2000). Algumas espécies
podem modificar o posicionamento das folhas e aumentar a eficiência
de utilização de radiação (Valladares & Pearcy, 2000), enquanto que
outras podem se apresentar menos competitivas e se extinguirem sob
condições de competição por luz, alterando a biodiversidade e a
qualidade da pastagem. O cultivo de espécies florestais de crescimento
rápido em sistemas de produção é lucrativo e, muitas vezes, mais
vantajoso de que a produção individualizada de grãos, madeira e
carne, particularmente quando se tratam de atividades implantadas em
solos de baixa fertilidade e muito arenosos. Sob esta ótica os
gêneros Eucalyptus e
Pinus já demonstraram
viabilidade prática, constituindo-se em importante referência para
plantio comerciais (Marchiori, 1992). O pecuarista, por sua vez,
além de garantir condições ambientais mais propícias para suas
pastagens e criações, garante também um suprimento de madeira, para
uso próprio ou para comércio (Figura 7).
A participação do Ministério da Agricultura no Programa Nacional de
Florestas - PNF criado pelo Decreto nº. 3420 de 20 de abril de 2000,
confirma a necessidade de formulação e implementação de políticas
públicas visando o fomento à produção de florestas plantadas para
pequenos e médios produtores rurais. Isto por que: a própria
expectativa de escassez futura tem feito o mercado sinalizar
aumentos reais de preços para madeira de reflorestamento; há
carência de madeira para usos múltiplos não só para venda, mas até
para o próprio auto suprimento dos produtores rurais; há uma demanda
da sociedade para que as leis ambientais sejam cumpridas com maior
rigor; há necessidade de se reduzir a pressão sobre as matas
nativas; há necessidade de inserir estes produtores de forma
organizada no agronegócio de modo a terem acesso à tecnologias
adequadas que garantam aumento da produção e produtividade e gerem
emprego e renda e melhor qualidade de vida para os mesmos e a
sociedade em geral (Figura 8).
Referências
BRASIL.Congresso Nacional.Senado Federal (1996) Conferência das
Nações Unidas sobre o meio ambiente e desenvolvimento: agenda 21.
Brasília: Subsecretaria de Edições Técnicas. IBGE.
Levantamento de Recursos Naturais: folha SH.22 Porto Alegre e
parte das folhas SH.21 Uruguaiana e SI.22 Lagoa Mirim. Rio de
Janeiro, RJ, 1986. 796p. (inclui mapas geológico, geomorfológico,
exploratório de solos, vegetação, capacidade de uso dos recursos
naturais renováveis, avaliação do relevo) (Levantamento de Recursos
Naturais, 33).
MARCHIORI, j.N.C.
Areais do sudoeste do Rio Grande do Sul: elementos para uma história
natural. Ciência e ambiente, Santa Maria, v.3, n.s., p.65-89. RIBASKI, J.;DEDECEK, R.A.; MATTEI, V.L.; FLORES,
C.A.; VARGAS, A.F.C.; RIBASKI, S. A.G. Sistemas silvipastoris:
Estratégias para o desenvolvimento rural sustentável para a metade
sul do Estado do Rio Grande do Sul. Embrapa (Comunicado Técnico,
150), Colombo, Pr, 2005. SANTOS, D.C. dos; LIMA, C.L.R. de; FLORES, C.A.;
PILLON, C.N.; KUNDE, R.J.; SANDRINI, W.C.
Avaliação da qualidade física e da matéria orgânica de um
Argissolo Vermelho derivado de arenito da Fronteira Oeste do Rio
Grande do Sul. Pelotas: Embrapa Clima Temperado, 2009. 26p. –
(Embrapa Clima Temperado. Boletim de pesquisa e desenvolvimento,
100).
SOUTO,J. (1994) Experiência na região de Alegrete no Rio Grande do
Sul. In: Pereira VP, Ferreira ME, Cruz MCP (eds.). Solos altamente
suscetíveis à erosão.
Jaboticabal: FCAV - UNESP, p.169-179.
SUERTEGARAY, D.M.; GUASSELLI, L.A.; VERDUM, R. org. Atlas da
arenização: sudoeste do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Secretaria
da Coordenação e Planejamento, 2001. 1.v.
USDA. Soil Survey Staff – Soil Survey Manual.
VALLADARES & PEARCY (2000)The role of crown architecture for light
harvesting and carbon gain in extreme light environments assessed
with a realistic 3-D model. Anales Jadin Botanico De Carlos Alberto Flores
Vilmar Luciano Matte
Dados para citação bibliográfica(ABNT): FLORES, C.A.;RIBASKI, J.; MATTE, V.L. Sistema agrossilvipastoril na região sudoeste do estado do Rio Grande do Sul. 2010. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2010_4/SistemaAgroSilvoPastoril/index.htm>. Acesso em:Publicado no Infobibos em 01/10/2010 |