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Fungos
em peixes e anfíbios: diagnóstico, prevenção e tratamento
Marcio Hipolito
Os fungos são um grupo de organismos
chamados heterotróficos, pois podem usar matéria viva ou morta para
crescimento e reprodução. Não são plantas, portanto, são incapazes
de produzir seu próprio alimento por fotossíntese. Podem ser
encontrados em qualquer ambiente – água salgada ou doce, em baixa ou
alta temperatura e, em muitos casos, possuem um valor ecológico,
pois processam restos orgânicos em decomposição.
Entretanto, os fungos podem ser um
sério problema para peixes e anfíbios quando estes se encontram
estressados ou doentes por diversos motivos: condições ambientais
inadequadas; falhas nutricionais; condições higiênicas sanitárias
deficientes; má qualidade da água ou quando feridos. Em todas estas
situações de fragilidade orgânica ou de lesão tecidual, os fungos
podem infectar os peixes e anfíbios, podendo também invadir as ovas
e os ovos destes animais.
Os fungos são agrupados pela
morfologia de seus vários estágios de vida. Todos produzem esporos e
é por meio destes que a sua presença e, em alguns casos, as doenças
causadas por eles são disseminadas. Os esporos são resistentes ao
calor, à seca, à desidratação, a desinfetantes e às defesas naturais
dos peixes e anfíbios.
Por natureza, esses micro-organismos
não são agentes patogênicos primários para os peixes e anfíbios e
não apresentam um comportamento epidêmico. Seu processo agressivo
está sempre associado a prévias condições estressoras, ferimentos,
de debilidade orgânica ou doença presente na criação animal e a
principal via de transmissão é pelo ambiente contaminado ou
alterado.
As principais doenças em peixes são:
Saprolegniose (micoses dérmicas):
comumente causada pelos fungos Saprolegnia, Achlya,
Aphanomyces e Dictyuchus, chamados de “mofos
aquáticos”. Apresentam zoósporos que, por serem biflagelados,
“nadam” à procura do hospedeiro. Os peixes, de todas as idades,
quando acometidos por micoses dérmicas apresentam alterações no seu
comportamento natatório, assumindo posições não compatíveis com sua
natureza. Podem comprometer todo o corpo do animal, envolvendo-o com
seu talo vegetativo miceliano, caracterizado como “algodão”,
inicialmente branco que, posteriormente, pela sujidade, passa a ter
coloração marrom. Esses fungos afetam principalmente animais
debilitados ou feridos e podem também comprometer animais sadios
quando a temperatura está abaixo do limite térmico de conforto da
espécie, quando a água apresenta qualidade muito baixa ou com
excesso de matéria orgânica, ou ainda quando ocorre alta densidade
de peixes, comprometendo toda a população, além da mortalidade dos
ovos. A micose dérmica é uma das mais perigosas doenças secundárias
na criação de peixes e é muito bem conhecida entre os criadores de
espécies ornamentais.
Branquiomicose:
causada pelo fungo Branchiomyces sp., essa doença é
conhecida, principalmente na Europa e nos EUA, como “necrose das
guelras” (gill rot) e também está associada à baixa
qualidade da água e pH ácido. Tem como principais sintomas a
letargia, o boqueamento na superfície (asfixia) e depois as lesões
nas guelras.
Ictiofiríase: doença
ocasionada pelo agente Ichthyophonus hoferi, associado a
baixas temperaturas. Por ser transmitida através da ingestão, esta
doença não apresenta sinais externos, podendo a pele, em casos
severos, assumir uma textura semelhante a “lixa”, devido às lesões
sob a pele e musculares, além de apresentar curvatura da espinha e
internamente os órgãos assumirem uma coloração cinza.
Outros fungos, como Rhizopus sp., Dermocystidium
sp., Exophiala sp., Hyphomycetes, etc, também
podem causar doenças e um dos fatores de susceptibilidade dos peixes
a esses agentes é a retirada de parte de seu muco protetor.
As principais doenças em anfíbios são:
Quitridiomicose:
causada pelo fungo Batrachochytrium dendrobatidis que se
desenvolve em células queratinizadas, causando hiperqueratose e
consequente morte por interferência nos processos respiratório e
hídrico. Esta doença está associada ao declínio mundial de anfíbios,
principalmente nos silvestres e recentemente na rã-touro.
Cromomicose / Cromoblastomicose:
com ocorrência em rã-touro e outros anfíbios, estas doenças são
causadas pelos agentes Cladosporium sp. e/ou Curvularia
sp. que ocasionam a cromomicose ou cromoblastomicose, apresentando
granulomas na pele e vísceras com hifas pigmentadas.
Saproleniose: micose
dérmica causada pelos fungos Saprolegnia sp. e Achlya
sp., ocorrendo principalmente em girinos de rã-touro.
Mucormicose: causa
granulomas viscerais em anfíbios silvestres.
Podem ser citadas ainda outras doenças como Ficomicose; Aspergilose;
Basidiobolomicose; uma infecção semelhante a Ichthophorus , em
anfíbios silvestres; Aspergillium sp., Candida sp.
e Penicillium sp. em rã-touro; Dermocystidium sp.
e Dermosporidium spp. em anfíbios silvestres, estando estes
dois gêneros ainda em uma classificação incerta, sendo considerados
por alguns pesquisadores como protozoários.
Diagnóstico
O diagnóstico basea-se na presença
“visível” do agente, como o crescimento miceliano (presença de
hifas); nas lesões de pele, boca e guelras; no exame das ovas e ovos
para verificar o crescimento fúngico; nos exames histopatológicos e
histoquímicos; na morfologia do agente e na cultura micológica em
meios apropriados. Ainda, as condições ambientais também devem ser
estudadas visando sua associação com a ocorrência da doença.
Prevenção
Pode ser feita através de medidas como
o descarte e/ou o isolamento de animais infectados; manutenção das
boas condições higiênico-sanitárias das instalações e utensílios;
manutenção da boa qualidade da água e boas práticas de criação
animal; limpeza e proteção das fontes e reservatórios de água.
Condições adequadas de manuseio e transporte dos animais e a
eliminação ou minimização de fatores estressantes também são formas
de prevenção. Deve-se destacar ainda a importância quando da
aquisição de novos exemplares que serão colocados nos tanques ou
como reposição na criação, sendo a prática da quarentena uma das
medidas a serem aplicadas. O uso de um período como “vazio
sanitário” também deve ser aplicado quando da despesca e retirada de
lotes, com seu consequente procedimento de limpeza e,
obrigatoriamente, quando da ocorrência de uma doença causada por
fungos.
O descarte de animais comprometidos,
após seu sacrifício, deve ser feito em uma área isolada e cercada da
propriedade. Os corpos destes animais devem ser incinerados ou se
colocados sob terra, em um buraco, devem ser cobertos com cal
virgem. Nunca devem ser reaproveitados, mesmo para alimentação
animal.
Tratamento
Todo tratamento deve sempre ser
acompanho por um médico veterinário. Para tal, utilizam-se sal e
produtos químicos como permanganato de potássio, azul de metileno,
formalina, sulfato de cobre e verde de malaquita, além de produtos
desinfetantes à base de iodo e cloro, sempre em forma de banho em
tanque próprio. O uso desses produtos e de medicamentos antifúngicos
específicos como, por exemplo, micostatina e seus derivados, sempre
devem ser levado em consideração pelo valor do animal, número de
indivíduos comprometidos, doses, modo de aplicação, custos, sistema
de criação, destino do animal e presença de resíduos.
Lembrar também que a qualidade geral e
as características locais da água podem interferir no desempenho da
ação dos produtos químicos. Outro fator importante a ser considerado
é o risco da presença de resíduos químicos no organismo animal
destinado à comercialização como alimento.
Atualmente, não se tem conhecimento
abrangente da importância das doenças e perdas causadas por fungos
na piscicultura brasileira, tanto animais de produção, como
ornamentais. Quanto à ranicultura, estudos recentes estão sendo
feitos visando, principalmente, conhecer a presença e extensão da
doença quitridiomicose em ranários comerciais, sendo já identificada
em espécies nativas. Para outros fungos, há vários relatos como
informações pontuais da presença destes agentes em rãs-touro de
criação comercial. Todos os relatos, porém, sem continuidade ou
estudos complementares.
O Instituto Biológico, por meio do
Centro de P&D de Sanidade Animal, possui forte atuação em
ranicultura por meio de consultorias; de procedimentos que envolvem
o manejo zootécnico, nutricional e higiênico-sanitário; de
orientações sobre métodos e atividades preventivas e profiláticas,
além da realização de diversos exames laboratoriais.
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Origem: Instituto Biológico -
www.biologico.sp.gov.br
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Marcio Hipolito possui
graduação em Medicina Veterinária pela Universidade de São
Paulo (1977), mestrado em Saúde Pública pela Universidade de
São Paulo (1996) e doutorado em Biotecnologia pela
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
(2004). É efetivo do Instituto Biológico - Centro de
Pesquisa e Desenvolvimento de sanidade Animal. Tem
experiência na área de Medicina Veterinária, com ênfase em
Patologia e Controle Sanitário em Ranicultura e Organismos
Aquáticos, atuando principalmente nos seguintes temas:
rã-touro, Rana catesbeiana, patologia, ranicultura e
sanidade de organismos aquáticos. Atualmente desenvolvendo
Pós-Doutorado no Instituto de Pesca.
CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/7169145074780135
Contato:
hipolito@biologico.sp.gov.br |
Reprodução autorizada desde
que citado a autoria e a fonte
Dados para citação
bibliográfica(ABNT):
HIPOLITO, M.
Fungos em peixes e anfíbios: diagnóstico, prevenção e
tratamento.
2009. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2009_2/FungosPeixes/index.htm>.
Acesso em:
Publicado no Infobibos
em 22/04/2009
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