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Ocorrência de Claviceps em amostras comerciais de sementes de Brachiaria analisadas de Janeiro de 2008 a Março de 2009.

 

                                                                                          Marta Helena Vechiato

                                                                                         Christiane Ceriani Aparecido

                                                                                        Celso Dornelas Fernandes

 

1- Introdução

 

            No início da década de 70 ocorreram as primeiras tentativas para produção local de sementes de forrageiras em decorrência dos preços elevados das sementes importadas da Austrália que predominavam o mercado de brasileiro. Com o sucesso dessas tentativas, rapidamente o País se tornou auto-suficiente, principalmente na produção de sementes de B. decumbens.
 

            Com a expansão das pastagens cultivadas e intensificação da atividade pecuária nos últimos anos, várias doenças de forrageiras começaram a ter importância significativa, especialmente nas regiões Centro-Oeste e Norte do Brasil, causando perdas em produtividade e qualidade das pastagens. Informações referentes aos agentes causais dessas doenças nas pastagens e nos campos de produção de sementes, bem como a influência dos mesmos na capacidade de suporte e produtividade das mesmas são escassas (VERZIGNASSI, et.al. 2003)
 

Entre as doenças consideradas mais importantes pode-se citar a mela-das-sementes da braquiária, causada pelo fungo Claviceps sulcata (forma teleomórfica de Sphacelia sp.). O Brasil é, sem dúvida, o maior produtor e exportador de sementes de braquiária no mundo tropical, portanto, uma doença como a mela causa grande preocupação ao pujante e dinâmico setor de sementes forrageiras, que movimenta mais de um milhão de dólares anuais (VERZIGNASSI & FERNANDES , 2001).
 

            De acordo com dados de 2004, a quantidade de sementes de forrageiras tropicais comercializada anualmente no Brasil está ao redor de 100.000 toneladas, com um valor bruto estimado em US $ 100 milhões, qualificando o País como o maior produtor de sementes de forrageiras tropicais do mundo. Da mesma forma, é também o maior exportador de sementes de forrageiras tropicais, com um volume aproximado de 5 mil toneladas de sementes exportadas anualmente, principalmente para suprir os mercados da América do Sul e Central (MATÉRIA TÉCNICA, 2004).
 

A exportação atinge mais de 20 países e movimenta anualmente mais de 250 milhões de dólares, gerando cerca de 50 mil empregos no país, uma vez que 95% da produção é exportada e, destas sementes Brachiaria brizantha cv. Marandu representa aproximadamente 38%, B. decumbens 26%, B. brizantha cv. MG-5 Vitória 15%, Panicum maximum cv. Tanzânia 4%, P. maximum cv. Mombaça 4%, B. brizantha cv. MG-4 2% e 8% de outras cultivares. Em relação ao mercado interno, a comercialização de B. brizantha cv. Marandu representa aproximadamente 60%, P. maximum cv Tanzânia e cv Mombaça entre 20 a 30%, B. decumbens cv Basilisk, B. humidicola e B. dictyoneura de 10 a 20% (TSUHAKO, 2008).
 

Apesar de relevante, a sustentabilidade do sistema de produção de sementes dessas gramíneas encontra-se ameaçada pela incidência de patógenos, os quais podem reduzir a produtividade e/ou qualidade do produto. Tal problema já tem sido constatado em campos de produção, principalmente em regiões onde se constata a ocorrência da doença denominada mela-das-sementes, cujo primeiro relato em sementes de Brachiaria sp. ocorreu no estado do Mato Grosso do Sul (FERNANDES et al., 1992). Em campos com elevada intensidade de mela podem ocorrer reduções expressivas de produtividade e qualidade das sementes de Brachiaria sp. (FERNANDES et. al., 1995).
 

            Diante dos riscos que a mela representa para a produção de sementes de Brachiaria spp. este trabalho teve como objetivo verificar a ocorrência do fungo do gênero Claviceps em lotes comercializados de janeiro de 2007 a março 2009.

 

2. Material e Métodos.

 

Amostras de sementes de Brachiaria, enviadas para análise no Laboratório de Patologia de Sementes do Instituto Biológico (Tabela 1), foram avaliadas para sanidade utilizando-se o método da inspeção direta das sementes secas (NEEGAARD, 1979; LUCCA FILHO, 1987) para verificar a presença de Claviceps.  Este método consiste na observação, à olho nu ou sob microscópio esteroscópico (lupa), com amostragem recomendada de 12 a 18g de sementes, verificando-se a presença de esclerócios ou de sementes agrupadas, caracterizando sintoma/sinal de “mela” (Figura 1). Neste caso, retira-se o material por meio da raspagem das sementes e, com auxílio de microscópio ótico, confirma-se a presença de Sphacelia, forma imperfeita ou anamórfica de Claviceps, observando-se as características dos conídios.

 

Tabela 1 – Número de amostras de sementes de Brachiaria recebidas e analisadas pelo método da inspeção direta da semente seca, de janeiro de 2008 a março de 2009.

 

 

Espécies de Brachiaria

Ano de recebimento

 

 

 

Total

                        2008                                         2009

Trimestre

 

Total

2008

 

Brachiaria brizantha

00

00

00

00

00

05

05

B.brizantha cv. Marandú

55

07

03

01

66

31

97

B. brizantha cv. Xaraés

24

05

02

02

33

15

48

B. brizantha cv. MG5

01

00

00

00

01

03

04

B. brizantha cv. Piatã

00

00

00

00

00

04

04

B. decumbens cv. Basilisk

32

27

03

01

63

38

101

B. humidicola cv. Llanero

05

07

00

00

12

01

13

B. humidicola cv. Humidicola

02

02

00

00

4

01

05

 

 

 

 

 

 

 

277

 

 

Figura 1. (A) sementes de Brachiaria com sintoma/sinal de mela causado por Sphacelia sp.; (B) escleródio de Claviceps sp.

 

 

3. Resultados e Discussão

 

            Os resultados expressos na Figura 2, obtidos pelo  método da inspeção direta das sementes secas, mostram que das 97 amostras de Brachiaria brizantha cv Marandú analisadas a freqüência de Claviceps sp., bem como de seu anamorfo Sphacelia sp. foi de 13,40% e 25,77%, respectivamente. As cultivares Llanero e Humidicola pertencentes à espécie B. decumbens, apresentaram respectivamente 15,38% e 20% de amostras com Sphacelia sp. Com relação aos escleródios de Claviceps, essas estruturas estavam presentes, apenas, na cv. Llanero, em 7,69% das amostras analisadas.

 

Figura 2. Freqüência de Claviceps sp. e Sphacelia sp. em amostras de sementes comerciais de Brachiaria spp., analisadas pelo método da inspeção direta das sementes secas, de janeiro de 2008 a março de 2009.

 

            Vale a pena ressaltar que, embora tenham sido analisadas apenas quatro amostras de B. brizantha cv. MG-5, detectou-se a presença tanto de escleródios de Claviceps sp. como de conídios de Sphacelia sp., em 3 amostras, resultando em uma elevada freqüência (75%). Para B. brizantha cv. Piatã, em quatro amostras analisadas, observou-se que 50% amostras apresentaram sintomas/sinais de mela, o que caracterizou a presença de Sphacelia sp.
 

De modo geral, a Figura 2 registra a presença de, pelo menos, a fase anamórfica (Sphacelia) do agente causal da mela-das-sementes de braquiária em todas as cultivares de B. brizantha, B. decumbens e B. humidicola analisadas. Conseqüentemente, em determinado momento do ciclo vital do fungo os escleródios irão se formar, caracterizando a presença da fase teleomórfica Claviceps, disseminando a doença a curta e longa distância. Diante deste fato, havendo comercialização, as pastagens formadas a partir lotes de sementes infectadas podem ser prejudicadas, além de causar problemas aos animais que delas se alimentam, isto porque espécies de Claviceps podem produzir alcalóides, substâncias que ficam armazenadas nos escleródios, os quais são consumidos pelos animais juntamente com a alimentação normal.
 

 Considerando que o Brasil é o maior produtor e exportador de gramíneas forrageiras do mundo a comercialização dos lotes poderá ser prejudicada, principalmente no que diz respeito ao mercado externo, pois existem restrições para a presença de Claviceps em inúmeros Países importadores. Além disso, a presença da mela em campos de produção de sementes dificulta colheita refletindo na produtividade.
 

Reduções expressivas de produtividade e qualidade das sementes de Brachiaria sp. têm sido observadas em campos com intensiva infecção da doença (FERNANDES et. al., 1995).        É importante lembrar que o plantio de sementes livres de patógenos é considerado um dos métodos mais eficientes no controle de doenças. Para isso, as medidas para reduzir ou eliminar os patógenos iniciam-se no campo de produção de sementes com manejo adequado, estendendo-se até o seu beneficiamento e armazenamento.

 

            O uso de sementes de má qualidade é causa freqüente de fracasso na formação de áreas de pastagens. A qualidade de um lote de sementes é o conjunto de atributos que determina seu valor para semeadura. De um modo geral, a semente é um insumo básico de grande valor e só a sua avaliação correta permite o uso adequado, o qual determina o aumento da produtividade e o sucesso da produção agrícola.

 

Diante desses resultados pode-se observar a deficiência na produção e comercialização de sementes de braquiária de boa qualidade sanitária, o que certamente acarretará prejuízos não somente ao que se refere à produtividade da cultura, mas também  ao não cumprimento das exigências do mercado externo no que se refere às barreiras fitossanitárias impostas às exportações brasileiras. É importante salientar que a avaliação da sanidade destas sementes é exigida apenas quando a produção é destinada à exportação.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

FERNANDES, C. D.; FERNANDES, A.T.F; BEZERRA, J.L. “Mela”: uma nova doença e, sementes de Brachiaria spp. no Brasil. Fitopatologia Brasileira, Brasília, v.20, n.3, p.501-503, 1995.

 

LUCCA FILHO, O. A. Metodologia dos testes de sanidade de sementes. In: SOAVE,J.; WETZEL, M.M.V.S. Patologia de Sementes. Campinas:Fundação Cargill, 1987.cap.10, p.276- 298.

 

NEERGAARD, P. Seed pathology. London: Mac Millan Press, 1977. 2v. 1191p.

 

TSUHAKO. T. A. Exportação de sementes de forrageiras tropicais. Disponível em: http:// www.matsuda.com.br/administracao/arquivo/Sementes. Acesso em 25.jun.2008.

 

VERZIGNASSI, J.R.; SOUZA, F.H.D. DE; FERNANDES, C.D.; CARVALHO, J.; BARBOSA, M.P.F.; BARBOSA, O.S.; VIDA, J.B. Estratégias de controle da mela em área de produção de sementes de Brachiaria brizantha cv. Marandu. Summa Phytopathologica, Botucatu, v.29, n.1, p.66-66, 2003. (Resumo).


VERZIGNASSI, R.J; FERNADES, C. D.
Doenças em forrageiras. Campo Grande, MS, ago. 2001 nº 50.

 


Marta Helena Vechiato - "Possui mestrado em Fitopatologia pela Faculdade de Ciências Agronômicas - Unesp (1996) e doutorado em Agronomia (Proteção de Plantas) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2002). Atualmente é pesquisador científico do Instituto Biológico. Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Fitopatologia, atuando principalmente nos seguintes temas: sementes, fungos, patologia de sementes, métodos de detecção, PCR e controle químico".
Contato:
vechiato@biologico.sp.gov.br

 

Christiane Ceriani Aparecido - "Possui graduação em Biologia Bacharelado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (1998), mestrado em Agronomia (Proteção de Plantas) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2001) e doutorado em Agronomia (Proteção de Plantas) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2005). Atualmente é pesquisadora científica do Instituto Biológico. Tem experiência na área de Microbiologia, com ênfase em Micologia, atuando principalmente nos seguintes temas: fungos fitopatogênicos, uredinales, biologia, etiologia e preservação de culturas fúngicas."

 

Celso Dornelas Fernandes - Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq - Nível 2 - "Possui graduação em Agronomia pela Universidade Federal de Viçosa (1985), mestrado em Agronomia (Fitopatologia) pela Universidade Federal de Viçosa (1988) e doutorado em Agronomia /Área de Concentração em Proteção de Plantas pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2003). É pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária-Embrapa desde 1989 e professor da Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal-UNIDERP desde 1992. As principais linhas de pesquisa que atua são: Doenças de plantas forrageiras; Melhoramento de plantas forrageiras visando resistência a doenças; Patologia de sementes de forrageiras tropicais e; Manejo integrado de doenças de plantas. Obteve resultados de pesquisa que contribuíram para o lançamento comercial das cultivares Xaraés e Piatã, de Brachiaria brizantha; de Tanzânia, Mombaça e Massai, de Panicum maximum; do Estilosantes Mineirão e Estilosantes Campo Grande (principal responsável), de Stylosanthes spp. Na Uniderp, é professor de Fitopatologia I no curso de Agronomia e é professor credenciado pela CAPES para Programa de Mestrado em Produção e Gestão Agroindustrial. Na Universisdade Estadual de Mato Grosso do Sul é professor credenciado pela CAPES para Programa de Mestrado em Agronomia. É consultor "ad hoc" das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa dos Estados de MT e MS e do CNPq. Também, é revisor de artigos das revistas Summa Phytopathologica, Pasturas Tropicales e Tropical Pant Pathology. Já recebeu vários prêmios, sendo o último da Embrapa, na Categoria tecnologia desenvolvida, o Estilosantes Campo Grande.



Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

VECHIATO, M.H.; APARECIDO, C.C.; FERNANDES, C.D.  Ocorrência de Claviceps em amostras comerciais de sementes de Brachiaria analisadas de Janeiro de 2008 a Março de 2009. 2009. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2009_2/claviceps/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 01/06/2009

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