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TATURANAS


Henrique Moisés Canter
Marcos Ferreira Santos
Elza Justo Nunes
Roberto Henrique Pinto Moraes
Eva Maria Anonia Kelen
João Luiz Costa Cardoso
Maria Aparecida de Paula
José Abílio Perez Junior

 

O Instituto Butantan, através do Laboratório de Entomologia, realiza pesquisas e identifica insetos de interesse médico que possuem veneno, como por exemplo, taturanas, abelhas e vespas. As taturanas ou lagartas são insetos pertencentes ao grupo dos Lepidópteros (borboletas e mariposas), sendo que no Brasil, duas famílias: a dos Megalopigídeos e a dos Saturnídeos, têm apresentado ocorrências de acidentes. Nos últimos cinco anos foram registrados vários casos, inclusive de mortes, no Rio Grande do Sul e Santa Catarina atribuídos à lagarta Lonomia obliqua (Saturnídeo), cujos espinhos venenosos em contato com a pele humana podem causar manchas escuras, além de hemorragias externa e interna (síndrome hemorrágica) com possíveis complicações fatais.

 

A Lagarta Lonomia oblíqua, ou simplesmente "taturana" (tatá=fogo + rana = semelhante), como é mais conhecida no sul do País (marandová, mandorová, mondrová, ruga, oruga, são outros nomes utilizados no Sul), é uma das fases do ciclo biológico de uma mariposa de coloração cinza (fêmeas) ou amarelo-alaranjada (machos), ambos com uma listra transversal sobre as asas. Elas vivem em média 15 dias na fase adulta como mariposa, aparecendo com mais freqüência nos meses de verão (novembro a março), quando, após o acasalamento, põem os ovos. Decorridos aproximadamente 10 dias após a postura dos ovos nas folhas e troncos de árvores como abacateiro, pessegueiro, araticum, pereira e outras árvores frutíferas, os ovos se rompem (eclodem). Surgem as lagartas (período larval) que passam a se alimentar da planta hospedeira durante a noite.

 

A preferência por árvores frutíferas faz com que a ocorrência dos acidentes seja maior em pomares. Neste período larval, de aproximadamente 3 meses, as taturanas aumentam de tamanho trocando de pele várias vezes, podendo alcançar até 8 cm de comprimento. Vivem em grupos e podem ser vistas durante o dia nos troncos das árvores, ocasião em que ocorrem os acidentes. Após a última ecdise (troca de pele), as taturanas entram na fase de pupa ou crisálida -o seu casulo, ficando sob as folhas caídas e restos vegetais no solo da base das árvores. Após este período de empupamento, que pode durar cerca de 3 meses, elas se transformam no que serão os futuros adultos alados: as mariposas machos e fêmeas. Em seguida à emergência das mariposas adultas, ocorrem os acasalamentos e, posteriormente, as posturas, completando o ciclo evolutivo.

 

As taturanas de forma geral apresentam uma coloração muito variada com combinações cromáticas que fascinam pela sua beleza, atraindo com muita facilidade o toque, principalmente, das crianças. O acidente é ocasionado pela introdução do líquido urticante na pele através de espinhos. Estes espinhos (cerdas) são estruturas de ponta aguda e frágil que ao contato com as partes descobertas do corpo, liberam o liquido.

 

No caso dos Megalopigídeos, a base da cerda é uma porção implantada na pele da lagarta, consistindo em uma bolsa cheia de substância tóxica, que, quando pressionado, impulsiona o líquido para cima, entrando em contato com a pele humana causando a lesão. A gravidade corresponderá ao número de espinhos envolvidos no acidente. Já no caso dos saturnídeos esta glândula se situa próxima da ponta do espinho que, ao quebrar-se no contato com a pele, libera o liquido. Estes espinhos podem estar distribuídos ao longo do corpo da lagarta em algumas espécies, ou ocultos sob pêlos longos e sedosos em outras, ou ainda ligados a tubérculos que se projetam da pele da lagarta formando vários pequenos "pinheiros" esverdeados (chamados de Scoli).
 

Cerdas urticantes (Scoli)

 

 

PRINCIPAIS LAGARTAS URTICANTES

   MEGALOPIGÍDEOS (Família Megalopygidae), géneros: LAGARTA DE FOGO (Megalopyge sp.) TATURANA-GATINHO, CHAPÉU ARMADO e SAUl' (Podalia sp.) M.lanata M.albicolis Lagartas geralmente solitárias e não-agressivas, de 1 a 8 cm de comprimento, possuem "pêlos" dorsais longos e sedosos de colorido variado (castanho, branco, negro, róseo) camuflando as verdadeiras cerdas pontiagudas e urticantes.

 

   SATURNÍDEOS (Família Saturnidae), géneros: Automeris sp.; Dirphya sp.; Lonomia sp.- entre elas a Lonomia oblíqua Walker:
 

Lonomia, com Scoli e sem pêlos sedosos

 

Vivendo em grupos, possuem cerdas urticantes em forma de espinhos semelhantes a pequenos pinheiros verdes (chamados Scoli) distribuídos no dorso da lagarta, não possuindo pêlos sedosos. A Lonomia oblíqua geralmente tem coloração verde com várias formações brancas em forma de 'U" ao longo da parte superior (dorsal) do corpo.

 

O DOLORIDO ACIDENTE

Em casos de acidente, é indispensável o tratamento médico

 

Normalmente os acidentes com taturanas ocorrem da seguinte forma: manuseando a vegetação, a pessoa toca a lagarta com as mãos ou a espreme entre os dedos. O contato com as cerdas pontiagudas faz com que o veneno contido nos "espinhos" seja injetado na pessoa. A dor na maioria dos casos é violenta, irradiando-se do local da "queimadura" para outras regiões do corpo. No caso das lonomias, algumas vezes aparecem complicações, como sangramento na gengiva e aparecimento de sangue na urina.

 

 No "Dicionário dos Animais do Brasil" (1968, p.  682), Rodolpho Von lhering afirma:"... em geral, a dor cede gradativamente, no espaço de algumas horas (ou após 36 horas, como o verificamos pessoalmente, quando nos sujeitamos a uma experiência compteta)". Obviamente este não é o procedimento cientifico ideal para o estudo dos sintomas, mas ilustra bem como os pioneiros da ciência e da saúde se expunham em busca do conhecimento.

 

OS SINTOMAS

Em acidentes com TATURANAS (Saturnídeos e Megalopigídeos):

   Dor imediata no local atingido, às vezes muito intensa
   Sensação de "queimadura"
   Aparecimento de inchaço (edema)
   Íngua

Em acidentes com LONOMIA:

   Dor e irritação imediatas no local atingido
   Às vezes dor de cabeça e ânsia de vômito
   Sangramentos pelo corpo, por exemplo: pele, gengivas, urina, pequenos ferimentos, nariz, etc.

O soro específico recentemente produzido, está sendo testado e deve ser aplicado em todos os casos que apresentem alterações na coagulação do sangue.

O TRATAMENTO

 

Em ambos os casos é INDISPENSÁVEL O ATENDIMENTO MÉDICO IMEDIATO.

O tratamento é feito com compressas frias e anestésicos injetáveis (lidocaína), sem que haja maiores complicações em sua evolução. Nos acidentes por Lonomia, devido às alterações na coagulação do sangue provocado pelo seu veneno, pode haver sangramentos e complicações como parada de funcionamento dos rins e hemorragias graves. Aqui é preciso que a pessoa acidentada receba o soro e atendimento médico especializado.

O INSTITUTO BUTANTAN, a partir de suas pesquisas experimentais, está desenvolvendo um soro específico para os acidentados com Lonomia.

O QUE FAZER -PRIMEIROS SOCORROS

Assim que ocorrer o acidente procure: socorro médico imediato.

Em caso de acidente, colete o animal e o encaminhe para o médico para
 identificação, mas jamais o toque diretamente

   Lavar bem o local com água corrente.
   Fazer compressa fria com água ou gelo.
   Não colocar sobre a "queimadura" nenhum produto químico ou orgânico (café, folhas, pasta de dente, gasolina, etc), e
   Levar algumas taturanas para a identificação da espécie.

ACIDENTES COM MARIPOSAS

 

Uma exceção a estes acidentes que ocorrem com os insetos no seu período larval (enquanto lagartas) é o caso de uma mariposa identificada como Hylesia sp. (Saturnídeo) de colorido acinzentado (fêmeas) ou castanho (machos) que quando pousada, mantém as asas em forma de telhado. Isto é, o acidente ocorre com a forma adulta do inseto devido ao fato de que, quando voando juntas em torno de luzes e lâmpadas, ao chocarem-se umas nas outras, liberaram pequenos flocos de pêlos contendo minúsculas "setas" que em contato com a pele humana causam várias irritações. Portanto, quando perceber mariposas voando ao redor de lâmpadas não permaneça embaixo delas.

 

NA NATUREZA NÃO EXISTEM VILÕES

Como se não bastasse o problema dos acidentes, esses insetos são também grandes pragas da lavoura, causando comumente danos em plantações inteiras. No entanto fazem parte do ecossistema mais amplo tendo papel importante no equilíbrio da natureza. Ao contrário do que vem sendo divulgado pela mídia esta taturana NÃO É ASSASSINA! Nenhum ser vivo (com excecão do ser humano...) é assassino. Matá-las indiscriminadamente não resolverá o problema, acarretando ainda mais problemas para a cadeia biológica. Portanto, precisamos saber conviver com elas (bem como com todos os seres vivos), evitando que possa ocorrer o acidente.

 

Uma das soluções que vem sendo estudadas é através do controle biológico da população de taturanas com a utilização de uma determinada mosca (família Tachinidae) ou vespa (família Ichneumonidae, género Ophion) que parasitam as lagartas alojando nelas os seus ovos. Estes ovos eclodem liberando as larvas da mosca ou vespa que vão se alimentando da própria taturana. Espera-se a breve conclusão desses estudos.

 

É importante ressaltar que a PREVENÇÃO ainda é o melhor remédio contra acidentes de qualquer natureza. Assim, ao trabalhar na lavoura, colher frutas no pomar ou em toda atividade em ambientes silvestres, observe bem o local, troncos, folhas, gravetos antes de manuseá-los, fazendo sempre o uso de luvas para evitar o acidente. Segundo alguns especialistas, a incidência maior de acidentes com estes insetos deve-se ao desmatamento, queimadas, extermínio de predadores naturais, loteamentos sem planejamento prévio e sem avaliação do impacto ecológico que isto acarreta, obrigando a procura destas espécies por outros ambientes para sobreviver. E aqui o encontro com o ambiente humano é inevitável.

 

* Material Produzido originalmente pela DIVISÃO DE DESENVOLVIMENTO CULTURAL do Instituto Butantan - www.butantan.gov.br, Contato: cultural@butantan.gov.br


FICHA TÉCNICA. _ Prof. Henrique Moisés Canter (Diretor de Divisão de Desenvolvimento Cultural); Prof. Marcos Ferreira Santos e Elza Justo Nunes – texto; Divisão de Desenvolvimento Científico: laboratório de Entomologia, fotos e texto: Prof. Roberto henrique Pinto Moraes; laboratório de Fisiopatologia: Dra. Eva Maria Anonia Kelen; Hospital Vital Brazil: Dr. João Luiz Costa Cardoso; Desenho: Maria Aparecida de Paula; Diagramação: José Abílio Perez Junior 

DIVISÃO DE DESENVOLVIMENTO CULTURAL  Av. Vital Brasil, 1500 -CEP 05503-900 -São Paulo-SP ­Tel.: (11) 3726-7222 Ramal 2117 - cultural@butantan.gov.br



Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

CANTER, H.M.; SANTOS, M.F.; MORAES, R.H.P.; KELEN, E.M.A.; CARDOSO, J.L.C.; PAULA, M.A. de; PEREZ JUNIOR, J.A. Taturanas. 2008. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2008_3/Taturanas/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 06/07/2008

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