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É possível a fixação Biológica de Nitrogênio no milho?

Ivana Marino Bárbaro
Sandro Roberto Brancalião
Marcelo Ticelli

No Brasil, os estudos sobre a fixação biológica de nitrogênio em leguminosas iniciaram-se nos anos 1950, sendo conhecido que nos últimos anos a utilização de inoculantes com Bradyrhizobium na cultura da soja, proporcionou, para o Brasil, uma grande economia em fertilizantes nitrogenados, que são necessários para manter a atual produtividade da cultura. De fato, a soja brasileira tornou-se altamente competitiva no mercado mundial por não depender da aplicação de fertilizantes nitrogenados (HUNGRIA e CAMPO, 2005).

 

A fixação biológica de nitrogênio consiste na principal fonte de nitrogênio para a cultura da soja. As bactérias do gênero Bradyrhizobium quando em contato com as raízes de soja infectam as mesmas, via pêlos radiculares formando os nódulos. Dentro dos nódulos, as bactérias por intermédio de uma enzima denominada dinitrogenase, presente em apenas alguns organismos procariontes, conseguem quebrar a tripla ligação do nitrogênio atmosférico e provocar a sua redução até amônia (NH3), ou seja, a mesma forma obtida no processo industrial. Deste modo, a esta mesma amônia são incorporados íons H+, abundantes nas células das bactérias, ocorrendo à transformação em íons NH4+, que serão distribuídos para a planta de soja e incorporados na forma de nitrogênio orgânico (HUNGRIA et al., 1997).

 

Alguns fatores que podem limitar a fixação de nitrogênio e conseqüentemente a produtividade em Glycine max (L.) Merrill., relacionam-se a competição por sítios nodulares entre estirpes utilizadas nos inoculantes e os rizóbios do solo, quando estas são de menor eficiência.

 

A aplicação de nitrogênio, concomitantemente com a inoculação pode diminuir a eficiência da inoculação, pois a planta responde ao estímulo da absorção, limitando o processo simbiótico, o que poderá resultar na diminuição dos benefícios posteriores ao processo. A necessidade de inoculação de uma cultura de grande importância econômica como a soja, está diretamente relacionada ao centro de origem fitogeográfico da espécie vegetal, sendo para a soja, o continente asiático, em especial a China.

 

Condições como baixa fertilidade do solo e elevadas doses de nitrogênio combinado, (GRAHAN e TEMPLE, 1984), o efeito da rizosfera, tensão da água, pH do solo, salinidade, temperatura, toxinas e predadores podem também afetar a nodulação e/ou a fixação do nitrogênio de leguminosas junto às vastas variedades de estirpes de Rhizobium (KAMICKER e BRILL, 1986). Na soja, por se constituir numa leguminosa introduzida e uma das poucas espécies que se associam com Bradyrhizobium japonicum, é pouco provável a ocorrência natural dessa bactéria em solos brasileiros, havendo, entretanto, possibilidades de que algumas das estirpes introduzidas no solo, juntamente com as sementes ou através de inoculação artificial, sobrevivam e se "naturalizem" (LIMA et al., 1998).

 

Em condições de campo, a formação de nódulos, poderá ser visualizada a partir da emergência (VE), entretanto somente nos estádios de desenvolvimento V2 e V3 é que a fixação de nitrogênio torna-se mais ativa. Após isso, o número de nódulos formados e a quantidade de nitrogênio fixada aumenta aproximadamente até o estádio R5.5, quando diminui bruscamente. Para verificação se os nódulos estão fixando nitrogênio ativamente para a planta, deve-se observar se internamente os mesmos apresentam coloração rosa ou vermelha, porém, quando se encontram brancos, marrons ou verdes provavelmente a fixação de nitrogênio não está ocorrendo (POTAFOS, 2006).

 

As possibilidades para a cultura do milho

 

Considerando a cultivo do milho, sabe-se que o rendimento é o resultado do potencial genético da semente, das condições edafoclimáticas, do local de semeadura e do manejo adotado na lavoura.

 

Deste modo, na moderna agricultura, para se alcançar rendimentos máximos nos cultivos de cereais, como o milho, são necessárias abundantes quantidades de fertilizantes, especialmente também os nitrogenados.

 

O grande interesse na fixação biológica em gramíneas é devido à maior facilidade de aproveitamento de água das mesmas em relação às leguminosas, pela maior efetividade fotossintética. As gramíneas apresentam um sistema radicular fasciculado, tendo vantagens sobre o sistema pivotante das leguminosas para extrair água e nutrientes do solo; e por serem as gramíneas largamente utilizadas como alimento pelo homem. Por isso, mesmo que apenas uma parte do nitrogênio pudesse ser fornecida pela associação com bactérias fixadoras, a economia em adubos nitrogenados seria igual ou superior àquela verificada com as leguminosas que podem ser auto-suficientes em nitrogênio (DÖBEREINER, 1992).

 

Nos últimos 20 anos foram feitas descobertas sobre o potencial das bactérias diazotróficas microaeróbias, do gênero Azospirillum, fixadoras de nitrogênio atmosférico, quando em vida livre (BODDEY e DÖBEREINER, 1995) as quais, quando associadas à rizosfera das plantas podem, contribuir com a nutrição nitrogenada dessas plantas, tornando-se alvo de estudo por parte de pesquisadores em biologia e fertilidade do solo. Assim sendo, o manejo correto dessa possível associação Azospirillum spp - Milho poderá resultar em incrementos de produtividade e em diminuição dos custos de produção, principalmente da aquisição de fertilizantes nitrogenados (OKON e VANDERLEYDEN, 1997) que são de uso intensivo na cultura do milho.

 

Essas bactérias, em regiões tropicais e subtropicais, ocorrem em números entre 103 a 106 por grama de solo, e em números ainda maiores na superfície de raízes de cereais e gramíneas forrageiras (DÖBEREINER et al., 1990).

 

O efeito da bactéria Azospirillum spp. no desenvolvimento do milho e em outras gramíneas, tem sido pesquisado, não somente quanto ao rendimento das culturas mas, também, com relação às causas fisiológicas que, possivelmente, aumentam esse rendimento. De acordo com Muñoz-Garcia et al. (1991) a inoculação das sementes de milho com Azospirillum brasiliense cepa UAP 77, promoveu aumento na matéria seca de raízes, da ordem de 54 a 86% e de 23 a 64% na matéria seca da parte aérea. Por sua vez, Salomone e Döbereiner (1996) avaliando a resposta de vários genótipos de milho à inoculação de quatro estirpes de Azospirillum spp. isoladas na Argentina e três de raízes de sorgo e milho isoladas no Brasil, constataram aumento de peso de grãos, variando em diferentes genótipos, da ordem de 1.700 a 7.300 kg/ha; contudo, tais resultados são bastante influenciados pelas condições de solo, ambiente e genótipos de planta. Didonet et al. (1996) mencionam que são muitas as evidências de que a inoculação das sementes de milho com Azospirillum brasilense seja responsável pelo aumento da taxa de acúmulo de matéria seca, principalmente na presença de elevadas doses de nitrogênio, o que parece estar relacionado com o aumento da atividade das enzimas fotossintéticas e de assimilação de nitrogênio.

 

Okon e Vanderleyden (1997) baseando-se em dados acumulados durante 22 anos de pesquisa com experimentos de inoculação a campo, concluem que o gênero Azospirillum spp. promove ganhos em rendimento em importantes culturas nas mais variadas condições de clima e solo; contudo, salientam que o ganho com Azospirillum spp. vai mais além do que simplesmente auxiliar na fixação biológica do nitrogênio, interferindo também no aumento da superfície de absorção das raízes da planta e, conseqüentemente, no aumento do volume de substrato do solo explorado. Tal constatação é justificada pelo fato da inoculação modificar a morfologia do sistema radicular, aumentando não apenas o número de radicelas, mas, também, o diâmetro médio das raízes laterais e adventícias. Pelo menos parte, ou talvez muitos desses efeitos de Azospirillum spp. nas plantas, possam ser atribuídos à produção, pela bactéria, de substâncias promotoras de crescimento, entre elas auxinas, giberilinas e citocininas, e não somente a fixação biológica de nitrogênio

 

Considerações finais

 

Em resumo, para outras plantas não-leguminosas, a exemplo do milho, estudos também mostraram associações com bactérias fixadoras de nitrogênio, embora, não havendo a formação de nódulos como acontece nas leguminosas, entretanto, o interessante é direcionar estudos relativos à melhor assimilação do nitrogênio. Nestas plantas, ocorre a colonização da superfície e/ou interior das raízes e interior da parte aérea por bactérias do solo que fixam nitrogênio do ar e disponibilizam as plantas. Neste campo, os resultados de seleção de estirpes inoculantes ainda não atingiram níveis tão elevados quanto à simbiose em leguminosas. Ainda assim, existem pacotes tecnológicos, utilizando variedades de plantas e estirpes bacterianas eficientes, que podem suprir mais de 50% do nitrogênio necessário à planta, devido à maior facilidade de assimilação do nitrogênio.

 

Entre os aspectos que devem merecer atenção dos pesquisadores, ressalte-se a seleção de estirpes adaptadas às condições locais e às culturas e cultivares usadas em cada região, sendo necessário testar-se as estirpes de Azospirillum, selecionando-se aquelas mais adaptadas às situações de clima e do manejo de culturas, para possível recomendação em um produto comercial.

 

Foto da implantação de experimento com Azospirillum em milho (CEC-Campinas/SP).

Foto da avaliação (sistema radicular) de experimento com Azospirillum em milho (Pólo Regional de Desenvolvimento Tecnológico dos Agronegócios da Alta Mogiana, Colina/SP).

 

Foto de avaliação (sistema radicular) de experimento com Bradyrhizobium em soja (Pólo Regional de Desenvolvimento Tecnológico Alta Mogiana – Colina/SP).

 

Literatura Consultada

 

BODDEY, R.M.; DÖBEREINER, J. Nitrogen fixation associated with grasses and cereals: Recent progress and perspectives for the future. Fertilizer Research, Oxford, v.42, p.241-250, 1995.

DIDONET, A.D.; RODRIGUES, O; KENNER, M.H. Acúmulo de nitrogênio e de massa seca em plantas de trigo inoculadas com Azospirillum brasiliense. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v.16, n.9, p.645-651, 1996.

DÖBEREINER, J.; PAULA, M.A. de, MONTEIRO, E.M.S. A pesquisa em microbiologia do solo no Brasil. Revista Brasileira de Biologia, Rio de Janeiro, v. 50, p. 841-854, 1990.

DÖBEREINER, J. Fixação de nitrogênio em associação com gramíneas. In: CARDOSO, E.J.B.N., TSAI, S.M., NEVES, M.C.P. Microbiologia do solo. Campinas: SBCS, 1992. p. 173-180.

GRAHAM, P.H.; TEMPLE, S.R. Selection for improved nitrogen fixation in Glycine max (L.) Merril and Phaseolus vulgaris L. Plant and Soil, v.82, p.315-327, 1984.

HUNGRIA, M.; CAMPO, R.J. Fixação biológica do nitrogênio em sistemas agrícolas. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA DO SOLO, 30., 2005, Pernambuco. Solos, sustentabilidade e qualidade ambiental. Pernambuco: SBCS, UFPE; Rio de Janeiro: Embrapa Solos, 2005. p.1-30. CD-ROM.

HUNGRIA, M.; VARGAS, M.A.T.; CAMPOS, R.J.A. A inoculação da soja. Londrina: Embrapa-CNPSo, 1997. 28p. (Embrapa-CNPSo. Circular Técnica, 17; Embrapa-CPAC. Circular Técnica, 34).

KAMICKER, B.J.; BRILL, W.J. Identification of Bradyrhizobium japonicum nodule isolates from Wisconsin soybean farms. Applied and Environmental Microbiology, v.51, n.3, p.487-492, 1986.

LIMA, S.C.; LOPES, E.S.; LEMOS, E.G.M. Caracterização de rizóbios (Bradyrhizobium japonicum) e produtividade da soja. Scientia Agrícola, Piracicaba, v.55, n.3, p. 360-366, 1998.

MUÑOZ-GARCIA, A.; CABALLERO-MELLADO, J.; VALDÉS, M. Promoción del crescimiento del maiz por cepas productoras de siderófos de Azospirillum y Pseudomonas fluorescentes. In: CONGRESO NACIONAL DE LA FIJACION BIOLOGICA DEL NITROGENO Y I ENCUENTRO IBEROAMERICANO DE INVESTIGACION SOBRE FIJACION DE NITROGENO, 3., 1991. Cuernavaca. Anais... Cuernvaca, México, p.61. 1991.

OKON, Y.; VANDERLEYDEN, J. Root-associated Azospirillum species can stimulate plants. Applied and Environmental Microbiology, New York, v.63, n.7, p.366-370, 1997.

POTAFOS. Como a planta de soja se desenvolve. Disponível em: http://www.potafos.org/ppiweb/brazil.nsf/87cb8a98bf72572b8525693e0053ea70/d5fbc829a2f54298832569f8004695c5/$FILE/Desenvolve.pdf. p. 1-23. Acesso em 30 de janeiro de 2006.

SALOMONE, G.; DÖBEREINER, J. Maize genotypes effects on the response to Azospirillum inoculation. Biology Fertilizer Soils, Oxford, v.21, p.193-196, 1996.

 


Ivana Marino Bárbaro concluiu o doutorado em Agronomia (Genética e Melhoramento de Plantas) [Jaboticabal] pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho em 2006. Atualmente é Pesquisadora Científica da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios. Atua na área de Agronomia, com ênfase em Genética e Melhoramento de Plantas. Em seu currículo Lattes os termos mais freqüentes na contextualização da produção científica, tecnológica e artístico-cultural são: soja, Glycine max, doença, caracteres, genótipos, correlações, seleção, caracterização agronômica, caracteres agronômicos, herdabilidade, reforma de canavial e cancro da haste.
Contato:
imarino@apta.sp.gov.br

 

Sandro Roberto Brancalião possui graduação em Agronomia pela Universidade Estadual Paulista - Jaboticabal (1999), mestrado em Agronomia (Agricultura) - Unesp-Botucatu (2002) e doutorado em Agricultura - Unesp-Botucatu (2005). Atualmente é pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas. Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Manejo e Física do Solo, atuando principalmente nos seguintes temas: estrutura do solo, estabilidade de agregados, cereais no inverno, nitrogênio, milheto, sistema plantio direto, cultura da soja, desenvolvimento, matéria orgânica do solo, fracionamento da matéria orgânica do solo, dinâmica da matéria orgânica do solo, reciclagem de nutrientes, culturas de cobertura, culturas de reforma para cana-de-açúcar, integração lavoura & pecuária e manejo do solo.
Contato:
brancaliao@iac.sp.gov.br

 

Marcelo Ticelli possui graduação em Engenharia Agronômica pela Faculdade de Agronomia e Zootecnia Manoel Carlos Gonçalves (1991) e mestrado em Engenharia Agrícola pela Universidade Estadual de Campinas (2001) . Atualmente é Pesquisador Cientifico da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios. Tem experiência na área de Agronomia , com ênfase em Fitotecnia. Atuando principalmente nos seguintes temas: Amendoim, Maturação, Sementes, Colheita.
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Contato: mticelli@apta.sp.gov.br



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Dados para citação bibliográfica(ABNT):

BÁRBARO, I.M; BRANCALIÃO, S.R.; TICELLI, M. É possível a fixação biológica de nitrogênio no milho?. 2008. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2008_2/fixacao/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 22/04/2008

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