A busca de NOVOS MEDICAMENTOS E A CONSERVAÇÃO DE RECURSOS GENÉTICOS DE PLANTAS MEDICINAIS

 

Gilberto A. Peripolli Bevilaqua
Gustavo Schiedeck

 

               A Amazônia possui cerca de 10% da flora mundial e vem se destacando na descoberta de novas drogas para a indústria farmacêutica, no entanto, apenas um percentual muito pequeno de suas plantas (ao redor de 5%) foi estudado quimicamente. Da mesma forma, no Rio Grande do Sul observa-se a presença de um número significativo de espécies com grande importância medicinal e de elevado potencial econômico, no entanto com pouquíssimo detalhamento técnico. Para citar apenas algumas mais comuns: o chapéu de couro (Echinodorus grandiflorus Mich.) e a arnica-do-mato (Chaptalia nutans), recomendadas e utilizadas como antifinflamatórias; a cancorosa (Jodina rhombifolia Hook. et Arn.) como cicatrizantes e anti-ulcerosas; a sete-sangrias (Culphea balsamona Cham.) e a pixirica (Leandra australis), como diuréticas e redutoras do colesterol e triglicerídos e, a erva-de-bicho (Polygonum hidropiperoides L.), contra problemas circulatórios.
 

               A procura por plantas medicinais tem crescido expressivamente nos últimos anos. Isto se deve a busca por terapias naturais, como a fitoterapia, e ao aumento do número de pessoas que não tem acesso aos medicamentos sintéticos modernos, cada vez mais caros. Nos Estados Unidos, o uso da fitoterapia e outros tratamentos naturais respondem por 30% do mercado nesta área. Estes fatos têm levado a exploração intensiva de espécies com grandes virtudes terapêuticas, como chapéu de couro e cancorosa, ocasionando riscos de extinção local ou regional das mesmas. Assim, o cultivo destas plantas seria uma alternativa viável de exploração com a conseqüente aumento da disponibilidade do produto e ao desenvolvimento sustentado destas áreas, sem agressão ao meio ambiente.
 

               Levantamentos efetuados junto a indústrias e farmácias atestam que mais da metade das plantas medicinais encontradas, no mercado formal ou mesmo informal, são nativas, obtidas através de coleta, sendo algumas espécies incultiváveis. Este fato demonstra que um número reduzido de espécies conhece-se métodos eficazes de propagação, para garantir uma oferta adequado do produto, demonstrando a importância do seu cultivo. A maioria das plantas podem ser propagadas por sementes, entretanto necessita-se, ainda, conhecer as condições específicas de clima e solo para florescimento e produção de sementes viáveis.
 

               O mercado das plantas medicinais é pouco conhecido e bastante difuso, sendo feito, principalmente através de mudas embaladas, e de sementes, em sua maioria importadas, compostas de espécies exóticas. As Regras de Análise de Sementes incluem normas para os testes de pureza e germinação para algumas espécies exóticas mais comuns, como: calêndula (Calendula officinalis L.), camomila (Matricharia recutita L.), mil-folhas (Acchillea millefolium L.), erva cidreira (Melissa officinalis L.), hortelã (Mentha x piperita L.) e losna (Artemisia absinthum L.). No entanto, não existem normas e padrões de campo e de semente ou mudas, para a produção e comércio da maioria das espécies nativas do Rio Grande do Sul.
 

               Algumas espécies medicinais tornaram-se especialmente importantes nos últimos anos, principalmente devido as suas virtudes terapêuticas e como fonte de renda na sua exploração. Relatórios atestam que chapéu de couro, fáfia (Pfaffia paniculata), ipê-roxo (Tabebuia heptaphylla) e erva de bicho foram as que apresentaram os maiores volumes de material exportado, em 2000, alcançando valores expressivos.  Assim, a produção destas plantas ou outras, com elevado potencial farmacêutico, podem tornar-se uma importante alternativa de receita para os produtores rurais. No entanto, tem-se observado problemas sérios de acondicionamento das plantas, principalmente quanto a secagem incompleta e o armazenamento em embalagens plásticas, sendo que a variação na concentração dos princípios ativos, a má qualidade dos produtos colhidos e o seu inadequado acondicionamento foram apontados como os principais obstáculos à exportação.
 

               Para a maioria das espécies nativas, a variabilidade genética existente não é totalmente conhecida e descrita, e sua propagação feita de forma vegetativa, constituindo-se em materiais geneticamente idênticos. Em muitos casos, plantas são tratadas com as mesmas propriedades medicinais, como por exemplo o quebra-pedra. As espécies Phyllanthus niruri e P. corcovadensis, são cientificamente indicadas, enquanto outras espécies do mesmo gênero são inócuas ou podem ser tóxicas. Por outro lado, tem-se observado uma perda da variabilidade genética das espécies nativas de elevado valor medicinal, pela exploração descriteriosa, levando ao desaparecimento de importante fonte de variabilidade, que as vezes não chega a ser conhecido. Resultados obtidos com chapéu-de-couro, dão conta que existem genótipos bastante distintos, ocorrendo variedades com floração mais precoces e mais produtivas em termos de matéria seca foliar.
 

            A coleta de ervas nativas pode resultar na obtenção de produtos de distintas composições químicas dadas as diferenças edafoclimáticas e genéticas. Resultados indicaram, para o chapéu de couro, que dentre 16 variedades analisadas, duas apresentam composição química mais numerosa e que, possivelmente, seriam aquelas indicadas ao tratamento fitoterápico. A análise da composição química das plantas possui uma dupla importância, torna-se essencial para efeitos de comercialização do material, de acordo com a nova legislação, na identificação dos materiais mais atrativos à indústria farmacêutica, além de auxiliar aos produtores na seleção de genótipos mais eficientes em termos fitoterápicos.
 

            Os princípios ativos mais importantes existentes nas plantas são: alcalóides, ácidos orgânicos, flavanóides, terpenos, taninos, óleos essenciais, entre outros, com atividades medicinais bastante específicas. Os mesmos podem estar distribuídos por toda a planta ou concentrarem-se em alguma parte específica, como folha ou raiz, ou em certa época do ano. A colheita das folhas por ocasião da floração, como é indicado para a maioria das plantas, pode não significar a melhor época para certas espécies nativas. Fatores ambientais como fertilidade e umidade do solo, pH e temperatura podem influir decisivamente na expressão de determinados princípios ativos. Resultados recentes demonstraram que, plantas de chapéu-de-couro cultivadas organicamente, possuem composição química semelhante àquelas coletadas em suas áreas de ocorrência natural.

 


Gilberto Antonio Peripolli Bevilaqua possui graduação em Agromomia pela Universidade Federal de Santa Maria (1986), mestrado em Ciência e Tecnologia de Sementes pela Universidade Federal de Pelotas (1993) e doutorado em Ciência e Tecnologia de Sementes pela Universidade Federal de Pelotas (1996). Atualmente é pesquisador A da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Clima Temperado. Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Produção e Beneficiamento de Sementes, atuando principalmente nos seguintes temas: Produção de sementes, variedades crioulas, feijão, plantas medicinais e capacitação.

Contato: bevilaq@cpact.embrapa.br

 

Gustavo Schiedeck possui graduação em Engenharia Agronômica pela Universidade de Passo Fundo (1992), mestrado em Fitotecnia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1996) e doutorado em Agronomia pela Universidade Federal de Pelotas (2002). Atualmente é pesquisador na Embrapa Clima Temperado e lotado na Estação Experimental Cascata. Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Sistemas Agrícolas de Produção de Base Ecológica, atuando principalmente nos seguintes temas: Agroecologia, horticultura, minhocultura e vermicompostagem, agricultura familiar e desenvolvimento sustentável.
Contato: gustavo@cpact.embrapa.br



Reprodução autorizada desde que citado o autor e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

BEVILAQUA, G.A.P.; SCHIEDECK, G. A busca de novos medicamentos e a conservação de recursos genéticos de plantas medicinais. 2007. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2007_4/medicinais/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 21/11/2007

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