Primeiro ano de experiência no Pólo Regional Noroeste Paulista:
I Reflexões sobre a realidade local

Dr. Waldo A. R. Lara Cabezas

Não pode passar em branco o primeiro ano de trabalho. Ainda quando se começa de zero. Talvez os momentos mais marcantes que levamos de nossa vida sejam as mudanças, a quebra total da rotina, quebrar paradigmas, e a tenacidade de enfrentar novos desafios com aspectos positivos e negativos, sempre caminhando junto ao que mais gostamos nesta vida. Neste caso desenvolver pesquisas como vocação de vida profissional, independentemente das adversidades econômicas, falta ou ausência total de infraestrutura, de fatores climáticos e dificuldades de obter credibilidade de nossos parceiros produtores. Por acima de tudo temos que lembrar sempre que nossa atividade tem a obrigação de gravitar regionalmente, na medida que nossos resultados e ações atendem as urgentes necessidades dos produtores.

O objetivo que me leva a escrever este primeiro artigo é fazer algumas reflexões da realidade local que encontramos para definir gargalos e propor soluções ao desenvolvimento rural regional. Vocês caros leitores, julguem e confiram se estamos enfrentando situações semelhantes.

Tive a graça de Deus de participar junto a produtores com pesquisas na implementação do sistema plantio direto em Uberlândia, MG (Triângulo Mineiro) vinculado a Universidade Federal de Uberlândia nos inícios da década dos 90. A experiência de 12 anos, participando da criação do Clube de Amigos da Terra em Uberlândia, eventos, palestras, publicando e escrevendo artigos divulgativos a nível local, me permitem enfrentar novos desafios, sem medo ao acerto ou erro, na medida que tomamos a iniciativa e abraçamos nossos ideiais,  alguns resultados mais relevantes das primeiras pesquisas desenvolvidas no Pólo, e ao mesmo tempo, mostrar as deficiências conseqüentes para ajudar a orientar às autoridades competentes, modestamente, no destino de futuros recursos financeiros para nosso próprio benefício. Mas antes disso, vale refletir sobre a realidade crua e nua que nos rodeia para ajudar a definição dos rumos a seguir.

            Inicialmente queremos deixar muito claro que na região não se entende nem se faz sistema plantio direto (SPD) de acordo aos princípios que regem o sistema: rotação de cultura, palha permanente sobre o solo, ausência de preparo como conseqüência do anterior e preparo profissional (emocional e técnico) para entrar no sistema. A causa principal? O lamentável estado da arte em que se encontram submersos os escritórios de desenvolvimento regionais (EDRs), quanto a atualização técnica e capacidade empresarial para fazer a requerida assistência técnica para a qual foram criadas. Eles teriam o papel fundamental de ser os motores propulsores da difusão e expansão do SPD. Falta reciclagem das novas tecnologias. Isto explica porque na prática faz-se agricultura em solo sem preparo, sem rotação planejada. O produtor mantém os vícios do preparo convencional: monocultivo, decisões conjunturais orientadas naturalmente pelo bolso, individualismo e imediatismo. Não vamos ainda adicionar (merecem comentários a parte), a composição fundiária principalmente de arrendatários e a invasão explosiva da cana-de-açúcar como cultura salvadora das desventuras do produtor. Isto é agricultura empresarial que participa do agronegócio brasileiro?  Não, mais é realidade. De passagem pergunto-me qual poderá ser o futuro do Programa de Microbacias Hidrografias, excelente como idéia, sem o devido preparo emocional e técnico dos extensionistas envolvidos na recuperação e conservação dos solos agricultáveis, envolvidos no Programa. Como será atendido esse aspecto?  Para mim resulta um mistério, exceto que esteja tão equivocado e apareçam os técnicos entendidos por arte de magia.

Estamos fartos e até convencidos que São Paulo é o motor de Brasil, clássico slogan político, mas que distorce a necessária humildade para ver que de bom temos para apreender de outros Estados neste país continental. Os clubes da Terra, atuantes em outros Estados, tem sido a solução congregando produtores com vocação e amor pela terra. São um exemplo de como podem ser relegados ao passado os vícios assinalados anteriormente. Como pesquisador convidado, participei de reuniões ordinárias desses grupos em Minas Gerais e Goiás, e posso afirmar que apreendi muito. Nossas pesquisas focadas à produção de alimentos,  são deficientes sim, quando não sabemos algo sobre quem está no frente de batalha, o produtor. O levantamento de demandas, sua hierarquização e sua implementação – solução através da pesquisa, devem ser nosso ponto de partida para levar rápidas respostas ao campo. Ainda com muita humildade devemos reconhecer que talvez muito mais valioso que o peso no PIB da agricultura, e a geração de novas fontes de trabalho, seja o produtor cuidando ciente ou inconscientemente do mais valioso que temos: os recursos naturais e sua manutenção no tempo, indefinidamente. E a sociedade urbana ignora isso.

            O aprendizado, sabemos deve ser realizado em etapas para haver efetiva mudança de mentalidade. Nesse sentido, no meu modesto modo de ver, antes de iniciar-se a implementação do tão falado “Integração Lavoura Pecuária” (ILP), deveria ser assimilado o SPD pelo pesquisador em experimentos de longo prazo, conjuntamente com o produtor como parceiro. O mais difícil de realizar é pesquisa em termos de rotação de culturas, o que requer tempo, para verificar-se os efeitos das culturas diversificadas em sucessão. Se olhamos agora para o Sul, sabemos que isso é possível. Superada a primeira fase de assimilação do sistema, poderemos partir para estudos mais complexos como ILP, incluindo-se a silvicultura. Se vemos que o grande entrave para a difusão deste sistema está na cabeça do produtor ou pecuarista para assimilar atividades que nunca fez, o pesquisador não está isento dessas limitações. Lembremos que a grande maioria de nós foi formado num foco temático e competitivo, e não holístico e de convívio multidisplinar efetivo, como o sistema requer.

            Acredito que um dos caminhos a seguir seja inicialmente congregar interesses comuns entre os pesquisadores interessados dos Pólos do DDD e dos Institutos, para a elaboração de um Projeto comum que atenda com matizes as realidades locais de cada Unidade, em locais definidos que constituam unidades pilotos a longo prazo (nas Unidades Pólos-Institutos ou em unidades produtivas) e participação efetiva do produtor. Todos saímos ganhando. O pesquisador ganha na  maior facilidade para aceder a recursos financeiros, barateamento nos custos da pesquisa, melhor aproveitamento na quantidade e qualidade de informação (esforço multidisciplinar), aumento na qualidade e quantidade de trabalhos a publicar, com o beneficio adicional de não estar repetindo experimentos já realizados. O produtor ganha uma parceria efetiva, convencimento dos benefícios pelos visíveis resultados em lucro, melhoria no uso da terra e aumentos verticais e não horizontais de produtividade, amadurecimento e mudança de mentalidade de subsistência para ação profissional. E finalmente o grande beneficiado de um consenso generoso das pessoas: o ambiente.


Waldo Alejandro Ruben Lara Cabezas concluiu o doutorado em Solos e Nutrição de Plantas pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz em 1991. Atualmente é Pesquisador nível III da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios. Publicou 32 artigos em periódicos especializados e 54 trabalhos em anais de eventos. Possui 6 capítulos de livros e 1 livro publicados. Possui 1 produto tecnológico, 1 processo ou técnica e outros 33 itens de produção técnica. Participou de 39 eventos no Brasil. Orientou 4 dissertações de mestrado e co-orientou 1, além de ter orientado 3 trabalhos de iniciação científica e 37 trabalhos de conclusão de curso na área de Agronomia. Recebeu 2 prêmios e/ou homenagens. Atua na área de Agronomia, com ênfase em Fertilidade do Solo e Adubação. Em seu currículo Lattes os termos mais freqüentes na contextualização da produção científica, tecnológica e artístico-cultural são: volatilização de amônia, N-15, cobertura de solo, uréia, milho, plantio direto, imobilização, eficiência de fertilizante, produtividade e adubação de cobertura.
Contato: waldolar@aptaregional.sp.gov.br



Reprodução autorizada desde que citado os autores e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

CABEZAS,W.A.R.L. Primeiro ano de experiência no Pólo Regional Noroeste Paulista:
I Reflexões sobre a realidade local
. 2007. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2007_1/ano1/index.htm>. Acesso em:


Recebido para publicação em 18/01/2007     Publicado no Infobibos em 22/02/2007

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