CONSIDERAÇÕES PARA MANEJO DO SOLO

por Otávio Antonio de Camargo
e Luis Reynaldo F. Alleoni

          Na prática da agricultura, é muito difícil evitar pequenas pressões que possam compactar o solo; entretanto, é possível usar algumas alternativas no manejo do solo, máquina e cultura, que minimizem o efeito da compactação. Logicamente, não existe um pacote de medidas que possa ser adotado em todas as condições. Existe, sim, um conjunto de medidas específicas para cada caso, identificáveis pelo técnico ou pelo agricultor, levando em consideração uma série de fatores, como: tipo de solo, espécies cultivadas, economia das operações, tipo de agricultura, clima, tipos de máquinas disponíveis e as alterações que possam ser feitas. Tecem-se, aqui, considerações sobre alguns desses fatores, com a finalidade de auxiliar na elaboração do conjunto de medidas necessárias para aliviar os efeitos maléficos da compactação.

O solo

          Ao trabalhar intensivamente num solo, dois pontos são de fundamental importância para evitar a compactação: o conteúdo de água no momento em que se opera e a possibilidade de manutenção ou aumento do teor de matéria orgânica.

A) Conteúdo de água

          A umidade é o mais importante atributo a ser levado em conta ao se tratar de compactação do solo. Portanto, é melhor operar em solos com umidade adequada (sempre mais secos do que úmidos), pois nestas condições a resistência à compactação é maior. Caso não se disponha de curvas de compactação do solo, como aquela da figura abaixo, é possível aplicar um teste fácil, no campo, para determinar se um solo se encontra ou não em condições de ser trabalhado por máquinas e implementos agrícolas, ou seja, se o conteúdo de água está ou não adequado às operações.

Curvas de compactação de um latossolo vermelho-escuro argiloso, obtidas no campo e em laboratório, com diferentes pressões de contato (Rd = roda dianteira; Rt = roda traseira) (adaptada de Novak et al., 1992)

 

          Toma-se uma porção de terra e procura-se moldá-la, até se conseguir formar um bastonete. Se o solo estiver muito seco, não será possível moldá-lo, e assim não é indicado que se proceda o preparo do solo, principalmente se ele for argiloso, pois haverá maior esforço tratório para penetração dos implementos e poderão ser formados torrões durante a realização das operações. Caso seja possível formar o bastonete ou o "corpo de prova", que é a designação técnica mais apropriada, deve-se procurar, por várias vezes, desagregá-lo e reconstruí-lo novamente. Se isso for possível, o solo estará no seu "estado de sazão", ou seja, no grau de umidade adequado para entrada de máquinas e perfeito serviço dos implementos. A umi­dade estará muito alta se a desagregação for difícil, ou seja, se a terra ficar aderida entre os dedos, sendo difícil de ser retirada.

          Nesse caso, recomenda-se esperar de um a três dias sem chuva para se proceder às operações agrícolas mecanizadas. Sendo a operação profunda, como subsolagem, por exemplo, tanto a superfície quanto a subsuperfície devem estar relativamente mais secas. Sendo uma operação que envolva cargas leves ou baixas pressões, pelo menos os primeiros 20-30 cm devem estar numa faixa de umidade adequada. O trabalho de máquinas em agricultura irrigada precisa levar este item em consideração, pois é comum trabalhar o solo em umidade ótima para compactação, podendo acarretar sérios danos às culturas.

B) Matéria orgânica

          Em trabalho conduzido em solos do Estado do Paraná, Kemper & Derpsch (1981) tiram interessante conclusão, que pode ser extrapolada para muitos solos brasileiros: o melhoramento no preparo mecânico dos solos, por si só, não é condição suficiente para evitar a compactação, a menos que seja suplementada com rotação de culturas e com o uso de plantas para cobertura do solo. A cobertura morta, advinda de restos culturais, é considerada o fator mais importante para explicar o maior conteúdo de água num solo sob plantio direto, quando comparado ao sistema convencional (Derpsch et al., 1986).

          As observações mostram que quando se colocam estercos, resíduos de culturas, ou quando se cultivam leguminosas em seqüência, ocorre uma diminuição na densidade do solo, proporcional ao aumento no teor de matéria orgânica (Larson & Almaras, 1971). Em condições tropicais e subtropicais, essa prática às vezes é difícil, dada a rápida oxidação da matéria orgânica. Entretanto, o uso de rotação de culturas, a incorporação de restos vegetais decompostos, esterco e composto e a prevenção de erosão são práticas que podem colaborar, e muito, para pelo menos manter seu teor no solo. Mesmo aplicações pesadas de resíduos que demandem sucessivas entradas de veículos no terreno são extremamente benéficas, pois a melhoria obtida nos atributos físicos suplanta, e com vantagens, a eventual compactação causada (Soane, 1990). A figura abaixo mostra que o aumento no teor de matéria orgânica provocou decréscimo na densidade de dois inceptissolos cultivados há vários anos (Bali et al., 1988).


 

Efeito de diferentes teores de matéria orgânica (0-50 cm), resultantes de vários sistemas de cultivo, na densidade de dois inceptissolos, em um experimento de longa duração - PD = plantio direto; CS = cultivo superficial; CC = cultivo convencional (adaptada de Ball et al., 1988)

Uso de máquinas

          Conforme a agricultura se intensifica, aumenta o uso de equipamentos que, embora bem projetados, ainda precisam ser operados com certos cuidados, pois sempre há uma tendência de exercer acentuada pressão no solo. Uma série de princípios básicos deve ser seguida para minimizar a compactação:

A) Uso de veículos que causem compactação mínima

          As rodas do trator ainda são as grandes causadoras da compactação. Algumas características dos pneus devem ser levadas em conta para perfeito entendimento de seus efeitos na compactação dos solos, destacando-se a carga nominal, as dimensões dos pneus e a pressão de inflação (Maziero, 1993). Trabalhando-se isolada ou conjuntamente com essas características, é possível aumentar, diminuir ou manter constante a pressão do contato pneu-solo.

          Raghavan et al. (1976) avaliaram um pulverizador de 3.624 kg, com pneus de 28,6 cm de largura por 61,0 cm de diâmetro e pressão de inflação igual a 1,4 MPa, acoplado a um trator com 4.670 kg, pneus de dimensões 46,7 x 76,2 cm e pressão de inflação 0,07 MPa. O pulverizador causou maior compactação do solo que o trator, devido à maior carga sobre a área de contato. Após analisar as isolinhas de densidade e observar que o pneu do pulverizador compactou maior volume de solo, os autores concluíram que a utilização de pneus mais largos, como no caso do trator, distribuiu a massa sobre uma área maior, resultando num menor grau de compactação.

          Entretanto, um aumento da largura ou do diâmetro do pneu pode não compensar determinado aumento na carga nominal, mesmo que se mantenham constantes as pressões de inflação do pneu e de contato pneu-solo. Assim, o aumento do peso do veículo não pode ser simplesmente compensado pelo aumento da área de contato, já que tem sido observada compactação na camada subsuperficial (abaixo de 10 cm) quando há aumento acentuado no peso do veículo, mesmo com a precaução de se manter a pressão de contato constante (Blackweel & Soane, 1981).

B) Controle do tráfego

          O planejamento do tráfego de veículos numa área é uma maneira prática de confinar a compactação numa região específica. Estudos com tráfego controlado intensificaram-se a partirdes anos 80 (Hadas et al., 1983; Cooper et al., 1983; Taylor, 1983). A adoção deste sistema faz com que boa parte da área agricultável fique livre da compactação pelos rodados, apesar de o controle do tráfego não resultar, necessariamente, em efeitos benéficos para todos os solos, estádios de crescimento das culturas ou sistema de produção.

          Entretanto, adverte-se que este sistema não deve ser empregado. Por exemplo, em solos com 400 g.kg-1 ou mais de arguas 2:1, o conteúdo de água e de nutrientes pode ficar na faixa disponível para as plantas, mesmo sob tráfego intenso do maquinário agrícola, devido aos planos de fratura dos solos. Daí o sistema não ser recomendado para essa condução. Dumas et al. (1973) encontraram um desenvolvimento radicular bastante limitado para o algodoeiro, de 0 a 20 cm, em linhas onde houve tráfego sobre um solo areno-siltoso, mas realçaram a vantagem do sistema em relação ao convencional, devido ao aumento na mobilidade do veículo e na eficiência de tração, a despeito da dificuldade de penetração das raízes nas faixas compactadas.

          Nas áreas onde o tráfego é controlado, é de se esperar não só um aumento na produção das culturas, mas também maiores taxas de crescimento das plantas, principalmente naquelas onde o trânsito de máquinas e veículos é intenso dentro de um mesmo ciclo. Na chamada "zona de produção", que corresponde à porção do terreno onde não há tráfego de veículos após o preparo do solo, obtêm-se maiores produções e máximas taxas de crescimento das culturas, como no caso da alfafa, em dois anos agrícolas (Tabela abaixo) (Rechel et al., 1987).
 

Produção de matéria seca e máxima taxa de crescimento de alfafa num entissolo franco-arenoso com áreas de diferentes intensidades de tráfego (adaptada de Rechel et al., 1987)

Ano Sistema Produção de  matéria seca Máxima taxa de crescimento
g.m2 g.m-2.dia-1
1984 Sem tráfego 687 38,8
  Com tráfego 327 21,3
1985 Sem tráfego 396 27,1
  Com tráfego 317 14,7

 

          Entretanto, é preciso estar atento para o fato de que, normalmente, há aumento representativo na densidade do solo que concentra as operações agrícolas, podendo gerar um desenvolvimento restrito das raízes, impedindo o perfeito estabelecimento das plantas. Para esses casos, a literatura aponta efeitos positivos de um cultivo superficial (0-15 cm) do solo compactado.

C) Planejamento no uso do maquinário

          O correto emprego da maquinaria agrícola associa-se, intimamente, à racionalização de trabalho de produção agropecuária. É praticamente impossível fazer mecanização racional quando o trabalho de produção agrícola se acha desorganizado, realizado a esmo, sem qualquer planejamento prévio.

          O primeiro passo para um bom planejamento inclui o levantamento das operações agrícolas a serem realizadas (aração, gradagem, subsolagem, aplicação de corretivos, plantio, adubação, aplicação de defensivos, colheita etc.). O segundo passo é quantificar a área a ser trabalhada e o tempo disponível, ou seja, estimar os dias efetivos de trabalho dentro dos períodos recomendados para realização das operações. É importante que se tenham anotações de controle dos serviços das máquinas, podendo-se, assim, estimar a porcentagem de dias úteis em que elas permanecem paradas devido a quebras e imprevistos.

          É importante, ainda, considerar a estimativa do número de dias, em cada mês, nos quais o conteúdo de água no solo não deverá apresentar restrições ao trabalho de máquinas e implementos. Esses números variam com o mês e com a região (Mialhe, 1974). De posse destes dados, é possível programar melhor as operações agrícolas, diminuindo os riscos de compactação devidos à entrada de máquinas e implementos em solo úrnido. Na próxima tabela, válida para algumas cidades do interior do Estado de São Paulo, nota-se que o número de dias em que não há restrições para entrada de máquinas e implementos, ou mais comumente chamados de "agronomicamente secos", diminui bastante de novembro a março. Neste período, marcado por chuvas intensas, aumenta bastante a possibilidade de compactação pelo tráfego de máquinas em solo com grau de umidade inadequado, pois muitas capinas mecânicas e aplicação de defensivos são efetuadas em culturas anuais, sendo também feitas às operações de gradagem niveladora e o plantio de culturas semiperenes, como a cana-de-açúcar, em cultivo de dezoito meses, na região Centro-Sul.
 

Número estimado de dias úteis para operações agrícolas, sem riscos de compactação, em três cidades do Estado de São Paulo, para dois tipos de solo: arenoso e argiloso (adaptada de Moretti Filho, 1960)

Meses Campinas Piracicaba Ribeirão Preto
Arenoso Argiloso Arenoso Argiloso Arenoso Argiloso
Janeiro 9 5 11 7 11 8
Fevereiro 10 4 11 7 15 12
Março 16 12 18 15 15 11
Abril 25 22 25 21 25 23
Maio 28 28 31 31 31 31
Junho 26 26 27 26 30 30
Julho 31 31 31 31 31 31
Agosto 31 31 31 31 31 31
Setembro 28 27 29 28 30 30
Outubro 20 19 22 20 23 23
Novembro 17 11 19 18 16 14
Dezembro 14 11 13 10 11 11

 

D) Escolha de máquinas e implementos alternativos

          Quando não há possibilidade de realizar as operações agrícolas na época adequada, deve-se empregar operações alternativas, sempre procurando diminuir ao máximo o contato das máquinas com o solo.

          Uma das culturas em que muitas máquinas e implementos são projetados e testados com este objetivo é a de cana-de-açúcar, na qual a mecanização chega a representar 20% ou mais do custo total de produção. Alguns destes implementos foram projetados para realizar as operações de preparo e sulcação do solo, a custos menores do que os normalmente contabilizados pelas usinas e destilarias. Assim, por exemplo, pode-se utilizar o sistema de cultivo mínimo, no qual a soqueira da cana é eliminada quimicamente com herbicida. Em seguida, é realizada a operação de sulcação, com vistas a um novo plantio de cana. No caso de haver problemas de compactação, é possível incorporar um subsolador na haste do sulcador, visando quebrar a camada subsuperficial compactada, facilitando, desse modo, a propagação do sistema radicular em profundidade. Salata et al. (1987) obtiveram resultados positivos e superiores aos do método convencional, com o uso do sulcador-subsolador em solos arenosos da região de Quatá (SP).

          Com o objetivo de estender o cultivo mínimo a solos argilosos, foi desenvolvido pela Cooperativa dos Produtores de Cana, Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (Copersucar) o sulcador-subsolador-destorroador, que efetua, simultaneamente, os operações de subsolagem, sulcação e destorroamento através da enxada rotativa, permitindo uma boa brotação da muda (Perticarrari & Ide, 1988). Existe outro implemento chamado sulcador Rossetti, semelhante ao modelo da Copersucar, diferenciando-se deste por possuir a enxada rotativa atrás da haste e internamente, entre as asas do sulcador. Em ensaio realizado num podzólico vermelho amarelo endoálico de Piracicaba (SP), foi observado em áreas onde se utilizou este sulcador, maior número de perfilhos, maior altura e maior peso de colmos de cana-de-açúcar, (variedade IAC 64-257), quando comparado ao sulcador convencional (Alleoni & Beauclair, 1996).

          Devido ao custo do herbicida no sistema de cultivo mínimo, foi idealizado pela mesma cooperativa o eliminador mecânico de soqueira, com objetivo de picar a soqueira e atirá-la fortemente sobre uma grelha, separando-a da terra e evitando sua rebrota. De acordo com Perticarrari & Ide (1988), a eliminação mecânica apresenta vantagens em relação à eliminação convencional com grades, em função da menor movimentação de solo, impedindo a formação da ca­mada subsuperficial compactada. A próxima figura mostra o sulcador-subsolador, o sulcador-subsolador-destorroador, o sulcador Rossetti e o eliminador mecânico de soqueira.

Esquema ilustrativo de implementos alternativos usados na cultura da cana-de-açúcar, com vistas a diminuir os custos de produção e a propensão à formação de camadas compactadas (adaptada de Perticarrari & Ide, 1988; Aleoni & Beauclair, 1996)

 

E) Uso de implementos em perfeito estado

          Os implementos de cultivo devem estar apropriados para máximo cumprimento de sua tarefa. Por isso, é importante mantê-los em plenas condições para realização dos trabalhos. Isso implica um rígido sistema de controle das operações agrícolas, envolvendo manutenção preventiva e corretiva, e acompanhamento do ritmo operacional dos conjuntos mecanizados. É necessário o conhecimento do número efetivo de hectares que cada conjunto trator + implemento realiza em determinada operação por hora, dia ou mês, para as condições específicas da propriedade agrícola. Tudo isso para evitar as operações feitas em condições de solo muito úmido, ocasionando a compactação e danificando o sistema mecanizado.

Cultivos

          O cultivo do solo é muito importante para manter o equilíbrio de sua porosidade. O princípio do cultivo mínimo, que significa não cultivar mais que o estritamente necessário, é básico para diminuir o tráfego e evitar maiores movimentos com o solo. Antes de realizar qualquer cultivo, o agricultor deve-se perguntar porque tal prática tem sido realizada. Como já foi citado, caso o cultivo seja realmente necessário, mas a umidade do solo esteja elevada, a operação deve ser adiada, sempre que possível, até que a umidade adequada seja alcançada.

          Não se deve arar o solo em maior profundidade do que o necessário. Assim, a profundidade de preparo do solo deve ser modificada em cada período de cultivo. Se a camada compactada estiver a menos de 30 cm de profundidade, ela pode ser rompida com arado de aivecas ou arado escarificador, atuando nesta profundidade (Castro & Lombardi Neto, 1992). O arado de aiveca corta, eleva, inverte e esboroa, parcial ou totalmente as leivas, que ficam dispostas lado a lado. Quando o serviço de aração com aivecas é bem feito, há enterrio total dos restos de cultura. O arado de aiveca produz uma inversão do solo melhor que a do arado de discos, mas apresenta restrições ao uso em solos com obstáculos, tais como pedras e tocos, caso não haja mecanismos de segurança, com desarme automático (Gadanha Júnior et al., 1991). O arado de discos é menos vulnerável a estas obstruções, pois o movimento giratório dos discos faz com que eles girem sobre o solo e a vegetação, cortando-os. A figura abaixo traz esquemas de arados de discos e de aivecas.

Modelos de arados de discos e de aivecas (Gadanha Júnior et al., 1991)

          O arado escarificador possui de cinco a onze ferros ou braços montados em barras paralelas (2 ou 3) sobre um quadro porta-ferramentas e espaçados entre si de 60 a 70 cm, em cada barra, de modo a dar um espaçamento efetivo entre sulcos paralelos de 30 a 35 cm (Figura 42). Este implemento promove a desagregação do solo de baixo para cima, atingindo profundidade maior do que a do arado de discos. Por este motivo, é utilizado para romper camadas compactadas oriundas da ação do arado e também de grades pesadas (Gadanha Júnior et al., 1991). O arado escarificador é semelhante a um subsolador, mas trabalha em profundidades menores, exigindo menor esforço tratório para execução das operações agrícolas.

Modelo de um cultivador de nove hastes, usado para quebrar camadas compactadas de subsuperficie (Gadanha Júnior et al., 1991)

          Derpsch et al. (1991) avaliaram um escarificador de sete braços, com 25 cm de vão livre entrebraços, e observaram que houve boa cobertura dos rastros deixados pelas rodas de um trator com 180 cm de largura de trabalho. Como os braços eram reguláveis, foi possível testar uma alternativa deixando o implemento com seis braços e utilizando tratores com potências na faixa de 44,8 kW (60 CV).

          Embora sejam muitas as vantagens do escarificador em relação à conservação do solo, já que os restos vegetais permanecem na superfície diminuindo o arraste superficial de água e terra, seu uso ainda restrito pode ser atribuído ao pouco conhecimento de suas qualidades por parte dos agricultores, ao menor controle de plantas daninhas em relação aos arados e grades (já que não há inversão e enterrio da camada superficial do solo) e à sua capacidade operacional, que é, em média, 10% menor que o das grades (Hoogmoed & Derpsch, 1985).

A) Subsolagem

          A subsolagem é uma prática de cultivo em profundidade que tornou-se comum em algumas regiões do país. Analogamente ao escarificador, ela serve para tornar soltas as camadas compactadas, sem, entretanto, causar inversão das camadas de solo, devendo somente ser recomendada quando houver uma camada muito endurecida, em profundidades não atingidas por outros implementos. Para otimizar a penetração no solo, alguns subsoladores permitem a regulagem de inclinação das hastes, em cuja extremidade inferior existe uma ponteira que pode ter diversos formatos, de acordo com o projeto do fabricante e o grau de compactação do solo (Gadanha Júnior et al., 1991; Aloisi et al., 1992). A figura 43 mostra um tipo de subsolador.

Esquema de um subsolador montado, de 3 hastes (extraída de Gadanha Júnior et al., 1991)

 

          Barbieri et al. (1997) mostram dois perfis de um latossolo vermelho-amarelo textura média, dos quais tem-se o corte transversal do solo, após o preparo e antes do plantio de cana-de-açúcar, abrangendo duas entrelinhas da cultura (Figura 44). No primeiro (a), o preparo do solo constou de quatro gradagens pesadas, uma gradagem niveladora e sulcação com sulcador convencional (sem a haste subsoladora ou enxada rotativa anexas). No segundo (b), foi feita também a subsolagem entre as gradagens pesadas. A área mobilizada e a área com compactação residual foram semelhantes para ambos os tratamentos; entretanto, observou-se que onde foi feita a subsolagem a camada compactada esteve mais fragmentada. É de se esperar, portanto, que as raízes de cana consigam se aprofundar mais nessa condição, podendo absorver maior quantidade de água e nutrientes, principalmente em períodos de estiagem.

Perfil de compactação de um latossolo vermelho-amarelo textura média, após preparo do solo e sulcação: (a) = gradagens pesadas + gradagem niveladora; (b) = gradagens pesadas + subsolagem + gradaem niveladora; A1 = área mobilizada pelas operações e A2 = área com compactação residual (adaptada de Barbieri et al., 1997)

          Os benefícios da subsolagem não são duradouros se houver tráfego intenso posteriormente. Variam com a densidade, umidade e textura do solo e com o número de operações agrícolas subseqüentes. Sene et al. (1985) observaram que a subsolagem promoveu incremento menor que 10% na produção de milho em solos arenosos com agregados de tamanho médio superior a 6 mm (Figura 45). Nesse tipo de solo, as raízes conseguiram crescer nos vazios entre os agregados, ultrapassando assim zonas de alta densidade do solo.

Relação entre o diâmetro médio de agregados de doze solos arenosos e o incremento na produção de milho devido a subsolagem (adaptada de Sene et al., 1985)

          Alguns autores entendem que são raríssimos os casos em que os subsoladores devem ser utilizados. Derpsch et al. (1991) afirmam que a grande maioria dos oxissolos e alfissolos do Estado do Paraná apresentam camadas compactadas em profundidades médias de 10 cm que não ultrapassam 15 cm, enquanto abaixo desta camada encontra-se uma estrutura intacta, com alta macroporosidade. Sendo assim, recomendam o uso de escarificadores em vez de subsoladores, apesar de ser uma operação agrícola extremamente cara, chegando a um custo de US$50,00/ha, a subsolagem pode ser economicamente viável, em alguns casos. Vasquez et al. (1989) obtiveram maiores produções de soja em áreas onde o subsolador foi utilizado e transformaram o aumento de produção em termos de quantidade de energia. Para as condições do ensaio, foi observado que a quantidade adicional de soja produzida equivaleria a 14.000 MJ/ ha, enquanto a subsolagem consumiu 820 MJ/ha, trabalhando a 33 cm. Nesse caso, os autores consideraram a operação extremamente eficiente, tanto sob o ponto de vista agronômico, quanto no energético.

          A subsolagem é, normalmente, a primeira operação de preparo do solo realizada pelos agricultores. Em seguida, há um elevado número de passagens subseqüentes de tratores e implementos. Por esse motivo, a resposta do solo à subsolagem tem sido pequena, às vezes negativa. É regra geral, em mecanização agrícola, que as operações que atinjam o solo a maiores profundidades devam ser precedidas de operações mais leves, a fim de que o resultado, em termos técnicos e operacionais, seja mais positivo. Salvador & Benez (1994) observaram que a subsolagem foi significativamente melhor quando realizada depois do preparo periódico do solo, pois resultou, em média, num aumento de 9,2% na capacidade operacional de campo e numa economia de 21,9% na exigência de força de tração, 15,2% no deslizamento de rodas e 21,9% no requerimento de energia por hectare.

          Outro aspecto importante nas operações subseqüentes à subsolagem é evitar a passagem do rodado em distâncias inferiores a 30 cm do local onde passou a haste do subsolador, senão os efeitos benéficos da operação serão praticamente anulados.

B) Plantas descompactadoras

          As raízes de certas plantas conseguem penetrar mais facilmente nas camadas compactadas do que outras, criando "caminhos" no perfil para crescimento das culturas seguintes (Henderson, 1989; Castro & Lombardi Neto, 1992). Ao contrário do que ocorre com o uso de subsoladores, estas plantas proporcionam um rompimento mais uniforme da camada compactada, além de contribuírem para melhoria do estado de agregação do solo. Quando as raízes dessas plantas morrem, são criados os chamados "bioporos", que podem aumentar o movimento de água e a difusão de gases, melhorando as condições do solo para a cultura subseqüente.

          Mesmo considerando que para a maioria das culturas, o crescimento das raízes é drasticamente reduzido na presença de camadas compactadas, algumas diferenças entre as espécies são observadas. Materechera et al. (1991), observaram a penetração de raízes de diversas plântulas num solo de textura média com e sem compactação, sendo que algumas delas aparecem na tabela abaixo.
 

Elongação e diâmetro radiculares de diversas plântulas com 10 dias de crescimento em solo com e sem compactação (adaptada de Materrechera et al., 1991)

  Elongação Diâmetro
Com* Sem Redução devido à compactação Com Sem Aumento devido à compactação
mm % mm %
Monocotiledôneas            
Milho 4,4 106,7 95,9 1,39 0,85 63,5
Arroz 3,1 60,2 94,9 0,56 0,40 40,0
Sorgo 3,4 63,8 94,7 0,78 0,56 39,3
Trigo 4,1 120,7 96,6 0,76 0,54 40,7
Dicotiledôneas            
Algodão 4,5 68,0 93,4 1,09 0,64 70,3
Tremoço 7,1 69,4 87,8 1,81 0,98 84,7
Soja 5,7 81,5 93,0 1,67 0,88 89,8
Girassol 6,4 105,3 93,9 0,98 0,52 88,5
* Com = com compactação (pressão de 4,2 MPa);
** Redução = (sem - com) x 100.sem-1;
*** Aumento = (com-sem) x 100.sem-1.


          A elongação das raízes de espécies dicotiledôneas foi um pouco maior que a das monocotiledôneas (5,4 x 3,4 mm.dia-1), enquanto o aumento no diâmetro de suas raízes foi bem maior (86 x 41%) e está diretamente relacionado à pressão máxima que as raízes são capazes de exercer, segundo a relação estabelecida por Misra et al. (1986):

Pm = 0,242 . dr0,94                    (11)

          em que Pm = pressão máxima das raízes em MPa, e dr = diâmetro das raízes em mm.

          Tomando-se, como exemplo, os diâmetros para as culturas do milho e da soja na presença e na ausência de camadas compactadas (Tabela 16), e aplicando-se a equação 11, tem-se o milho: Pm = 0,21 MPa (sem compactação) e Pm = 0,33 MPa (com compactação), enquanto para a soja, Pm = 0,24 MPa (sem compactação) e Pm = 0,39 MPa (com compactação).

          Em nossas condições, Alvarenga et al. (1994) testaram o crescimento de diversas leguminosas num latossolo vermelho-amarelo argiloso compactado, concluindo que o feijão-de-porco (Canavalia ensiformes) foi a espécie mais afetada pela compactação, ao passo que o mata-pasto (Senna occidentalis) sobressaiu-se como a espécie com maior potencial para crescer em camadas compactadas de solo. Bons resultados têm sido também reportados para o nabo forrageiro (Raphanus sativs) e para o feijão-guandu (Cajanus cajan).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

          Uma observação importante feita por Gerald et al. (1972) que deve sempre nortear o comportamento do agricultor é de que o acompanhamento ou a avaliação periódica da resistência mecânica do terreno - de modo análogo ao feito na análise de solo para fins de fertilidade - é uma maneira excelente de se determinar, para cada local, as necessidades de cultivo profundo e avaliar os efeitos do manejo, como cultivo mínimo ou seqüência de culturas, sobre as condições físicas do solo. Procedendo desta maneira, o agricultor estará conhecendo cada vez mais os efeitos causados no solo pelo sistema de produção adotado e, acima de tudo, estará coletando subsídios importantes para conservação de seu maior patrimônio, que é o solo.

LITERATURA CITADA


ALLEONI, L.R.F. & BEAUCLAIR, E.G.F. Efeito do tipo de sulcador em diversos parâmetros de crescimento e na produtividade da cana-de-açúcar. STAB-Açúcar, Álcool e Subprodutos, Piracicaba, 14(3):24-27, 1996.

ALOISI, R.R.; PAGGIARO, C.M.; BIBIAN, R.; MACHADO JÚNIOR, A.P. & ALBUQUERQUE, F.C. Uso de hastes subsoladoras em áreas de cana-de-açúcar. STAB - Açúcar, Álcool e Subprodutos, Piracicaba, 10(6):26-30, 1992.

ALVARENGA, R.C.; COSTA, L.M.; MOURA FILHO, W. & REGAZZI, A.J. Crescimento de raízes de leguminosas em camadas de solo compactadas artificialmente. In: REUNIÃO BRASILEIRA DE MANEJO E CONSERVAÇÃO DO SOLO E DA ÁGUA, 10., Florianópolis, 1994. Resumos. Florianópolis, EPAGRI/SBCS, 1994. p.200-201.

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Otávio Antonio de Camargo, formado em engenharia agronômica (1967) e mestre em Agricultura (1972) pela Esalq-USP e PhD pela Universidade da Califórnia (1978).
É pesquisador do IAC desde 1969 (atualmente nível VI), professor colaborador da Esalq-USP desde 1990 e bolsista de produtividade do CNPq desde 1970. Já foi do Comitê externo de avaliação de diversos Centros e de programas da Embrapa e do CNPq. Tem diversos livros, capítulos de livros e boletins editados e é autor de aproximadamente uma centena de artigos científicos em revistas nacionais e internacionais. É editor associado da Revista Brasileira de Ciência do Solo desde 1979, revisor de diversas revistas nacionais e internacionais e assessor científico da FAPESP e do CNPq, entre outras agências financeiras, desde 1980.
Contato: Otávio Camargo


Luís Reynaldo Ferracciú Alleoni, formado em engenharia agronômica, (1985), mestre (1992) e doutor (1996) em Agronomia, Área de Concentração: Solos e Nutrição de Plantas, e Livre-Docente em Química do Solo (2000), todos pela ESALQ/USP, além de Pós-Doutorado na Universidade da Florida (2005-2006). Trabalhou como pesquisador científico no Centro de Tecnologia da  Copersucar e no Instituto Agronômico de Campinas, e como docente na Fundação Faculdade de Agronomia Luiz Meneghel (Bandeirantes- PR) e na Universidade de Marília. É professor da Departamento de Solos e Nutrição de Plantas da ESALQ/USP desde 1997 e bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq desde 1998. É Editor-Chefe da revista Scientia Agricola e é autor de aproximadamente 50 artigos  científicos em revistas nacionais e internacionais. É assessor científico da FAPESP e do CNPq, entre outras agências financeiras, desde 1999.


 

Reprodução autorizada desde que citado o autor e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

CAMARGO de, O. A.; Alleoni, L.R.F. Considerações para manejo do solo. 2006. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2006_3/C7/Index.htm>. Acesso em:


Publicado no InfoBibos em 02/11/2006