RECUPERAÇÃO DE SOLOS
DEGRADADOS PELA AGRICULTURA*
por Maria Teresa
Villela Nogueira Abdo
O surgimento de áreas degradas é considerado cada vez mais um tema
preocupante. Conseqüentemente a recuperação destas áreas tem
envolvido um grande número de técnicos das mais diversas áreas.
Essas atividades têm assumido um papel fundamental na recuperação
dessas áreas, pois com a degradação, inviabiliza-se o
desenvolvimento sócio econômico uma vez que esses solos degradados
se tornam improdutivos.
Com a degradação do solo ocorre a poluição dos rios e o
desaparecimento da flora e da fauna natural do local, acarretando na
perda significativa da biodiversidade. Além do comprometimento da
camada fértil do solo que pode ser perdida, removida ou enterrada,
em áreas degradadas, observa-se uma alteração da qualidade e regime
de vazão do sistema hídrico. Esses problemas estão interligados e
qualquer diagnóstico ou intenção de minimizar os danos requer uma
visão multidisciplinar.
A recuperação de áreas degradadas é um conjunto de ações
multidisciplinares, idealizadas e executadas por profissionais de
diferentes especializações que visam proporcionar o restabelecimento
de condições de equilíbrio e sustentabilidade existentes
anteriormente em um sistema natural (Griffith & Dias, 1998).
Para o projeto de avaliação mundial da degradação do solo (GLSOD -
Global Assesment of Soil Degradation), os fatores de degradação de
solo são:
- Desmatamento
para fins de agricultura, florestas comerciais, construção de
estradas e urbanização;
- Superpastejo;
- Atividades
agrícolas, com o uso insuficiente ou excessivo de fertilizantes, uso
de água de baixa qualidade na irrigação, uso inadequado de máquinas
agrícolas e ausência de práticas agrícolas.
- Exposição do
solo à ação dos agentes erosivos pela exploração intensa da
vegetação;
- Atividades
industriais ou bioindustriais que causam a poluição do solo.
Atualmente cerca de 15% do solo mundial (1.966 106 ha)
encontra-se degradado distribuído nas diferentes regiões do planeta:
Região |
Porcentagem |
América do norte |
5% |
Oceania |
12% |
América do sul |
14% |
África |
17% |
Ásia |
18% |
América central |
21% |
Europa |
23% |
Avaliando-se a área de ação dos fatores de degradação temos a
seguinte situação:
Fator de degradação |
Porcentagem da área mundial degradada |
Superpastejo |
34,5% |
Desmatamento |
29,4% |
Atividades agrícolas |
28,1% |
Exploração intensa da vegetação para fins domésticos |
6,8% |
Atividades industriais e bioindustriais |
1,2% |
Na América do Sul, são 244 106 ha de solo degradado sendo
que 41% devido ao desmatamento, 27,9% ao superpastejo, 26,2% a
atividades agrícolas, 4,9% à exploração intensa da vegetação. No
Brasil embora não ajam dados exatos, aponta-se o desmatamento e as
atividades agrícolas como principais fatores de degradação.
Embora o impacto de obras de engenharia e mineração sensibilize mais
a população, essas atividades têm uma ação intensa em uma área muito
menor quando comparada ao desmatamento e superpastejo. Deve-se
avaliar o impacto de uma degradação tanto pela extensão quanto pela
intensidade. Muitas vezes uma degradação pontual tem um efeito muito
maior, pois pode atingir leitos de rio e comprometer uma bacia
hidrográfica inteira (Griffith & Dias, 1998).
No caso da agricultura, a retirada da mata, a implantação de
pastagens com o uso inadequado de insumos onde o solo não fornece
nutrientes suficientes para o desenvolvimento da vegetação, aliada a
manutenção de carga excessiva de animais e o manejo inadequado dos
solos sem o uso de práticas conservacionistas são as principais
causas de degradação.
Umas das dificuldades de recuperação destas áreas degradadas está na
falta de diagnóstico precoce, pois a perda de solo com a ocorrência
de erosão superficial e a perda de fertilidade demora a ser
percebida pelos agricultores. Para que essa situação seja evitada a
ciência do solo tem tentado associar a degradação à alteração dos
parâmetros de qualidade do solo. Diversos autores têm apontado os
parâmetros e atributos de qualidade do solo e salientam que os
valores de referência não devem ser fixos. Os valores de referência
devem ser os obtidos em uma área próxima à área avaliada em que não
tenha havido ação antrópica.
Pode-se citar
como indicadores de degradação:
Indicadores físicos - textura,
profundidade do solo, profundidade do horizonte superficial e das
raízes, densidade do solo, taxa de infiltração e capacidade de
retenção de água.
Indicadores químicos - Carbono orgânico
total, matéria orgânica do solo , N total, pH, condutividade
elétrica, N, P e K disponíveis.
Indicadores biológicos - C e N contidos
na biomassa microbiana, N potencialmente mineralizável (incubação
anaeróbica) e taxa de respiração do solo.
Além do manejo inadequado do solo, com ausência de práticas
conservacionistas a retirada da mata natural ou a implantação de uma
cobertura vegetal insuficiente acarreta na aceleração do processo de
degradação. A cobertura vegetal protege o solo de diversas formas:
na copa, na superfície e no interior pelas raízes; acrescenta
matéria orgânica deixando os solos mais porosos que, juntamente com
as raízes mortas que formam galerias, facilitam a penetração da
água; as plantas tiram água do solo e lançam na atmosfera pela
transpiração; sombreiam o solo diminuindo a evapotranspiração.
Com base nessa situação, além de um trabalho de conservação ter uma
abrangência regional, tomando a bacia hidrográfica como referência,
ele deve analisar o uso posterior da área, dando importância
substancial às praticas conservacionistas adotadas, ao manejo de
solo das áreas de contribuição e à cobertura vegetal ou cultura
agrícola que aí será implantada.
ESTABILIZAÇÃO DE UMA VOÇOROCA
A seguir será apresentado um trabalho de estabilização de uma
voçoroca, realizado na Estação Experimental de Agricultura de
Pindorama, atualmente denominada APTA – Pólo Centro Norte. Numa área
de aproximadamente 700 metros de extensão havia uma voçoroca que em
alguns locais possuía até 15 metros de profundidade (Vieira &
Martins, 1998).
O processo erosivo aconteceu em uma área de solo originário de
arenito, um argissolo, eutrófico, de textura arenosa/ média, bem
drenado e com declividade compreendida entre 2 e 10%. Essa
declividade aliada ao caráter muito arenoso do horizonte A e a
diferença de porosidade e argila entre os horizontes A e B
(gradiente textural), fazem com que sejam estreitamente susceptíveis
á erosão hídrica (Lepsh e Valadares, 1976). Essa susceptibilidade à
erosão fora agravada pelo manejo inadequado da área, aonde ao longo
de décadas estava instalada uma pastagem com a área de contribuição
sem práticas conservacionistas. Isso fez com que o volume de água em
excesso e a má infiltração fossem cada vez mais aprofundando os
trilhos do gado em direção ao leito de água localizado na parte mais
baixa da área. Finalmente formou-se uma erosão de proporções
consideráveis como observado nas fotos abaixo:
|
Área antes das obras 1998 |
O projeto consistiu basicamente na construção de quatro açudes em
desnível que tinham como finalidade conduzir a água numa velocidade
controlável e estabilizar o processo erosivo instalado.
Foram construídos quatro taludes de contenção como pode-se observar
abaixo:
Para que a água excedente proveniente da chuva em época de maior
precipitação pudesse escorrer livremente foram construídos canais
escoadouros de concreto que ligam o açude ao açude subseqüente de
menor ( fotos abaixo):
Após o término das obras o que se viu foi uma estabilização
do processo erosivo o que persiste até hoje conforme fotos
abaixo:
|
Vista da área em 1998 |
|
Vista da área em 2005 |
Após a estabilização do processo erosivo algumas
práticas foram adotadas. A área de contribuição recebeu
especial atenção com a instalação de algumas práticas conservacionistas. Dentre elas pode-se citar:
|
|
Área terraceada com bacia de
retenção |
|
|
Antes |
Depois |
Recuperação
de estradas |
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Canais vegetados para condução de
água proveniente de terraço e curvas em desnível |
RECOMPOSIÇÃO DA MATA CILIAR DO AÇUDE
Como proposta de recuperação da cobertura vegetal,
apresentamos a seguir o projeto de recomposição da mata ciliar do açude. Esse
projeto foi desenvolvido em um açude adjacente ao local da voçoroca e é o que
pretende-se realizar no entorno dos quatro açudes construídos na estabilização
da voçoroca.
Numa área de aproximadamente 50 x 200 metros foram
plantadas aproximadamente 1600 mudas de espécies nativas. O espaçamento entre as
mudas foi de 2,5 m x 3,0 metros e como a área possuía duas situações distintas,
área seca e área úmida , foram utilizadas espécies adaptadas para cada situação.
Na área úmida as mudas foram plantadas sobre elevações de terra “murunduns” para
evitar podridão do caule e foram aberto pequenos drenos temporários. Na área
seca as mudas foram plantadas em covas convencionais. A limpeza do terreno foi
realizada com controle químico e roçadeira costal e o controle do mato foi feito
até 150 dias após o plantio.
A proporção de plantio para os grupos ecológicos foi:
pioneira (P) 60-70%, secundárias (S) 30% e climácicas (C) 10%. O plantio no
campo seguiu o esquema abaixo:
•P P P
P P P P P P P P P P P P P P P P P P
P S P P P S P P P S P P P S P P P S
P P P
S P S C S P S C S P S C S
P S C S P S C S P
P P P S P P P S P P P S P P P S P P P
S P
P P P P P P P P P P P P P P P P P P P
P P P
Todas as
mudas receberam 1,5 kg de calcário, 200g de superfosfato simples e cobertura
morta assim como rega manual nas covas até o pegamento das mudas.
A seguir
algumas fotos da instalação do projeto:
|
Vista da área
antes do plantio |
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Abertura de drenos e plantio em
murunduns de mudas de área úmida |
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Vista da área durante o plantio |
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Vista da área após o plantio em 2003 |
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Vista geral da área em 2005 |
Literatura Consultada
ABDO, M.T.V.N. Recuperação de áreas degradadas: o
exemplo da voçoroca em Pindorama- Monografia. Curso
de Especialização em Geografia e Meio Ambiente-FAFICA/UEL.
Catanduva-SP,1999.158p.
GIFFITH, J. J.; DIAS,E. L. Conceituação e caracterização
de áreas degradas. In: DIAS, E. L. & MELLO, J. W. V.
Recuperação de áreas degradadas, Viçosa, UFV, 1998,
p. 1 -7.
LEPSCH, I. F. & VALADARES, J. M. A. S. Levantamento
pedológico detalhado da Estação Experimental de
Pindorama. Bragantia, Campinas, v. 35, n. 40,
p.1976.
VALERI, S. V.;POLITANO, W,; SENÔ, K. C. A ;BARRETO, A.
.L. N. M. Manejo e recuperação florestal, Funep,
Jaboticabal, 2003. 180p.
VIEIRA, S.R; MARTINS,A.l.M.e SILVEIRA, L. C.P.
Relatório de Implantação do Projeto de Recuperação
Ambiental da Estação Experimental de Agronomia de
Pindorama, SP, Pindorama, 1999. 13p.
* Palestra proferida no V Encontro Nacional sobre Educação
Ambiental na Agricultura, no Instituto Agronômico-IAC - Campinas/SP em 13/9/2006
Maria Teresa Villela Nogueira Abdo possui
graduação em Engenharia Agronômica pela Escola Superior de Agricultura (1986) e
mestrado em Produção Vegetal pela Faculdades de Ciências Agrárias e Veterinárias
Campus Jaboticabal (2005). Atualmente é Doutoranda do Departamento de Produção
Vegetal da Faculdades de Ciências Agrárias e Veterinárias Campus
Jaboticabal. Tem experiência na área de Agronomia. Atuando principalmente nos
seguintes temas: Cucumis sativus L, vigor, análise, hortaliças.
(Texto gerado automaticamente pela aplicação CVLattes)
Contato:
mtvilela@pinnet.com.br
Reprodução autorizada
desde que citado o autor e a fonte
Dados para citação
bibliográfica(ABNT):
ABDO, M.T.V.N.
Recuperação de solos degradados pela agricultura.
2006. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2006_2/RecSolos/index.htm>.
Acesso em:
Publicado no
Infobibos em 13/09/2006
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