MINHOCULTURA

por Ângelo Artur Martinez

     A criação de minhocas (minhocultura) é, entre nós, uma atividade recente e desconhecida do grande público. A exemplo dos demais países da América do Sul, ela teve início no final de 1983, com matrizes trazidas da Itália pelo Comendador Lino Morganti, para a sua propriedade em ltú (SP).

     
Thomas Barret, considerado o "pai" da criação de minhocas em cativeiro, foi o primeiro a demonstrar a viabilidade de criá-las em larga escala, através de um sofisticado sistema de canteiros, na década de 40, nos EUA, daí ser esse país considerado a pátria da minhocultura.

     
O comércio de minhocas vivas, como isca para a pesca esportiva, tem sido o grande responsável pelo desenvolvimento da minhocultura em muitos países.

     
Nos EUA, estima-se que os 100 milhões de pescadores ali existentes movimentam centenas de milhões de dólares anuais com o comércio de minhocas para finalidades esportivas, dispondo, para tanto, até de "containers" de tipo "caixa 24 horas".

     
No Brasil, os baixos investimentos exigidos na sua criação têm levado muitas pessoas a se interessarem em explorar a minhocultura como uma fonte de carne (proteína) barata, para a alimentação de pequenos animais, como rãs, peixes, aves, camarão-de-água-doce, e, principalmente, na produção de húmus, esterco de minhoca ou vermicomposto (terra vegetal), para fins de jardinagem, florístico, de paisagismo e da agricultura em geral, capaz de proporcionar-lhes um rendimento extra.

     As minhocas são animais que se caracterizam, em particular, por apresentarem os seus corpos segmentados, interna e externamente. Esses segmentos (somitos) que, conforme a espécie, variam enormemente, desde sete nas espécies microscópicas, até mais de quinhentos nos minhocuçus, e assemelham-se a pequenos anéis, daí o porquê de elas serem chamadas de anelídeos, do Phylum  Annelida.

     De acordo com o número e o tamanho desses anéis, são encontrados indivíduos desde cinco milímetros de comprimento até 3,30 metros, como a Megascolides australis, a gigante das minhocas.
 
      Em todo o mundo, estima-se que existam cerca de 1.800 espécies de minhocas, ou mais de 3.000, incluindo-se as desconhecidas.

Reprodução

     Os oligoquetas, como também são conhecidas as minhocas, são animais hermafroditos, isto é, apresentam os órgãos reprodutores masculinos e femininos num mesmo indivíduo. Entretanto, eles não conseguem se autofecundar, havendo a necessidade do concurso de um parceiro.

     É interessante sabermos que a minhoca é hermafrodita e que após o acasalamento, cada indivíduo, sem distinção, irá produzir um casulo com até 7 ovos por dia (espécies comerciais).

Espécies Comerciais

Apenas três espécies são criadas comercialmente:

1- Eisenia foetida, ou minhoca dos montes de esterco;
2- Lumbricus rubellus, ou minhoca de resíduos orgânicos, a "verdadeira" Califórniana (California-red). Essas duas espécies, embora sejam de origem européia, são conhecidas comercialmente como "vermelha da Califórnia"; e
3- Eudrilus eugeniae, "african nightcrawler", a gigante africana, de introdução mais recente, que vem se constituindo na "vedete" das minhocas, entre criadores e pescadores.

 

A gigante africana pode atingir 22 centímetros de comprimento, sendo a mais preferida, apesar de apresentar o in conveniente da fuga dos canteiros.

“bolo” de gigante africana pronto para comercialização como matriz, pesca ou alimentação animal.

     No Brasil, estão sendo criadas (misturadas) as espécies 1 e 3, de acordo com a classificação feita pelo professor Gilberto Righi, do Departamento de Zoologia da Universidade de São Paulo, especialista em oligoquetas. Devido ao nosso clima tropical, há uma predominância da gigante africana nos canteiros dos criadores.

Criação

     A criação é feita em canteiros de 1m de largura por 0,40m de altura e comprimento variável de 10 a 15 metros.

     Para a construção do canteiro, ao nível do solo, com fundo de terra batida, podem ser usados tijolos, blocos, tábuas e o bambu aberto no meio, com uma declividade interna de 2%, para facilitar o sistema de drenagem.

Canteiros construídos com bambu aberto no meio, com fundo de terra e protegidos com lona plástica nas  laterais. Criado pelo autor.

Matéria-prima

     Para o carregamento do canteiro, podemos usar o esterco animal curtido, lixo domiciliar ou outra fonte de matéria orgânica em decomposição, que, além de servirem como um ambiente natural para as minhocas, são usados na sua alimentação. Para tanto, o esterco de gado, o mais utilizado, deve ser fermentado-compostado.

     Inicialmente, faz-se uma camada de restos de culturas, como colmos e talos de plantas, folhas, capins e cascas, ricos em fibras (carbono), com mais ou menos 30cm de altura, sobre a qual coloca-se uma camada de mais ou menos 10-15cm de esterco fresco, rico em nitrogênio e, assim, sucessivamente, até completar a pilha. Não se deve esquecer que ao se fazer uma nova camada de material fibroso mais esterco, a camada anterior deve ser umedecida. Essa pilha deve ter 1,50 de altura, 2m de largura e 5 a 6m de comprimento, com formato de um telhado com 4 águas.

     Após a compostagem (cerca de 30 dias), quando a temperatura da pilha esfriar, podemos, então, colocar o composto no canteiro para que as minhocas promovam a sua humificação.

Matrizes

     As matrizes podem ser adquiridas com os criadores que as comercializam, tendo, geralmente, como base de venda o litro de minhocas (mais ou menos 1.500), cujo preço varia de acordo com a região.

Povoamento do Canteiro

Para iniciantes: 1 litro de minhocas/metro quadrado de canteiro, com comprimento de 5 a 6 metros (fase de adaptação e multiplicação das matrizes) .
Canteiro comercial: 5-6 ou mais litros de minhocas/metro quadrado de canteiro, já que elas foram produzidas pelo próprio criador.

     As matrizes devem ser colocadas livremente na superfície do canteiro logo na parte da manhã, e, a seguir, cobertas com o capim que protege o canteiro, para evitar que elas fujam com a chegada da noite.

Condução do Canteiro

     Além da alimentação (esterco), da temperatura, da acidez, da aeração e da drenagem do canteiro, o teor de umidade é da máxima importância para o desenvolvimento das minhocas; sempre que o teor cair abaixo de 80%, o canteiro deve ser irrigado.

     Cuidados especiais devem ser dados, quase que diariamente, aos inimigos naturais das minhocas: galinha; porco; sanguessuga; pássaros; formiga lava-pé; etc.

Bateria de canteiros de tijolos construídos acima do solo. Projeto caro.

Colheita das Minhocas

     A colheita pode ser manual, diretamente sobre o canteiro ou sobre uma mesa, junto com o húmus (matrizes), ou ainda através de máquinas (peneiras).

     Segundo Bonanni, na Itália, alguns criadores com certa técnica conseguem produzir até 4kg de minhocas por metro quadrado de canteiro por mês.

Colheita manual de minhocas sobre uma mesa em local sombreado, como matrizes.

Colheita mecânica das minhocas e/ou húmus com peneira elétrica cilíndrica, rotativa. fazenda Fittipaldi Citrus, do senhor Emerson Fittipaldi, em Araraquara, SP.

Colheita do Húmus

Armazenamento do húmus em galpão, na sombra, pronto para comercialização.

     Dependendo da população inicial de minhocas e da condução do canteiro, dentro de 30 dias, este poderá ser descarregado e o seu húmus peneirado.
Produção esperada: Mais ou menos 150kg/m2/canteiro (40 a 50% de umidade). O preço varia de acordo com a região.

     A matéria orgânica humificada, no caso o vermicomposto, é de grande importância para a fertilidade de nossos solos e, conseqüentemente, para a produtividade agrícola, porque ela atua nas propriedades físicas, químicas e biológicas do solo.

*Texto base também publicado no site da CATI - www.cati.sp.gov.br


Ângelo Artur Martinez é engenheiro agrônomo formado na Escola Superior de Agronomia - "Luiz de Queiroz" ESALQ-USP em 1963, como funcionário da Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo - Coordenadoria de Assistência Técnica Integral - CATI, foi um dos responsáveis pelo projeto de implantação e consolidação da exploração comercial da cultura da Seringueira, Hevea brasiliensis Muel. Arg. no Estado de São Paulo.
Contato: angeloartur_martinez@yahoo.com.br

 

 


Reprodução autorizada desde que citado o autor e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

MARTINEZ, A. A. Minhocultura. 2006. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/artigos/2006_2/minhocultura/index.htm>. Acesso em:

Publicado no Infobibos em 25/07/2006