EFEITO DA COMPACTAÇÃO NO CRESCIMENTO DE PLANTAS

 

por Otávio Antonio de Camargo  e Luis Reynaldo F. Alleoni

 

Efeito da pressão externa no crescimento radicular

 

          Quando uma raiz encontra um poro no solo cujo diâmetro é menor que o seu, só prosseguirá se expandindo se for capaz de exercer pressão suficiente para dilatar o poro ou então, terá que diminuir seu diâmetro o suficiente para passar através dele. Parece que, na realidade, o diâmetro da raiz, quando ela encontra tais obstáculos, aumenta ao invés diminuir.

          Um experimento muito interessante, que apresenta clara evidência de que a raiz precisa forçar sua passagem, foi desenvolvido por Wiersum (1957), que cultivou plântulas de diversas espécies em tubos de diferente diâmetros contendo areia compactada a uma determinada densidade do solo.

Desenvolvimento radicular de plântulas em vasos de diferentes diâmetros com área compactada à mesma densidade do solo

          A penetração diminuiu com a diminuição do diâmetro do tubo; este fato pode ser interpretado como uma resposta ao aumento da resistência do meio. A resposta das raízes ao impedimento mecânico se resume, essencialmente, à pressão que a raiz precisa exercer para aumentar sua dimensão ou criar novos poros.

          Uma medida interessante seria o número de raízes que conseguem atravessar a camada compactada e o número de raízes que inicialmente penetraram nessa camada. A relação entre eles é definida como razão de penetração de raízes (RPR), sendo maior o seu valor, quanto maior for a produção das culturas.

          Num experimento realizado por Asady et al. (1985) com a cultura do feijoeiro, a produção foi igual a l ,6 t.ha-1 quando a RPR foi nula, ou seja, quando as raízes não conseguiram romper a camada compactada. À medida que a razão de penetração de raízes aumentou, a produção foi-se tornando cada vez maior. Foram também determinados os valores de porosidade total do solo: quando a porosidade era 0,15 m3.m" 3, a RPR foi 0,2, e a produção igual a 2,5 t.ha-1; quando a porosidade foi 0,3 m3.m-3, a razão de penetração de raízes passou a 0,7, e a produção subiu para 3,3 t.ha-1. Conclui-se que as melhores condições do espaço poroso do solo permitiram às raízes uma maior penetração na camada compactada e, conseqüentemente, maior absorção de água e nutrientes, proporcionando aumento significativo na produção.

Relação entre a razão de penetração de raízes (número de raízes que conseguem atravessar uma camada compactada/número de raízes que penetraram na camada) e a produção do fejoeiro (Asady et al., 1985)

 

A) Pressão mínima à elongação radicular

        O balanço de forças externas e internas são responsáveis pelo crescimento radicular, e a raiz pode exercer pressões de até 0,9 a 11,3 MPa contra as paredes dos poros do solo. O que interessa, entretanto, não é a pressão máxima que a raiz pode exercer, e sim qual a pressão imposta pelo meio que reduz consideravelmente a elongação radicular. Russel & Gross (1974) conduziram experimentos com o objetivo de mostrar resposta de plântulas de cevada à pressão externa. Uma pressão aplicada de 0,02 MPa reduziu a extensão radicular à metade, e uma de 0,05 MPa reduziu este valor a um quinto da extensão das raízes da planta testemunha. Uma relação geral para diversos experimentos foi encontrada:

 

          E = 0,79 + 0,92exp-(0,387p)                      (9)

 

          em que E = taxa de elongação da raiz (comprimento a dada pressão/comprimento a pressão zero); p = pressão aplicada (MPa); exp = função exponencial. Há poucas informações sobre outras plantas (Russel, 1977); entretanto, pode-se dizer que à pressão entre 0,02 e 0,05 MPa a elongação radicular é bem diminuída, apesar de haver diferenças entre espécies de plantas. Numa pressão igual a 0,025 MPa, por exemplo, raízes de cevada (Russel & Goos, 1974), milho (Barley, 1962) e trigo (Goss, 1977) apresentaram alongações que corresponderam, respectivamente, a 43, 85 e 65% do crescimento de raízes sem impedimento mecânico.

 

B) Efeito da pressão na ramificação e distribuição das raízes

 

          O tamanho ótimo de um agregado após o preparo do solo, varia com a cultura anterior, com o preparo e com a quantidade de água (via chuva ou irrigação) durante seu período de crescimento. O papel que os agregados do solo têm no crescimento das raízes está relacionado, em parte, com o grau de penetração das raízes no seu interior.

 

          Como a compactação provoca diminuição no tamanho dos poros, a ponto de impedir a passagem da raiz principal, a planta lança mão de mecanismo de defesa via expansão de raízes laterais com diâmetros adequados para passar pelos poros. Essas raízes laterais parecem responder à imposição de obstáculos mecânicos de maneira muito semelhante à principal. Assim, se o obstáculo é imposto a ambas, todo o sistema se tornará definhado e, nessas condições, ficará inteiramente coberto por pêlos radiculares.

 

Efeito da pressão na ramificação das raízes (a) com obstáculo à raiz principal e as laterais; (b) sem obstáculos; (c) com obstáculos à raiz principal

 

          Se houver obstáculo apenas à raiz principal, proliferam-se as laterais, formando uma configuração de sistema radicular muito denso e raso que, em condições de campo, dificilmente sobrevive a um período de seca. Em condições de laboratório, a planta pode sobreviver, absorver nutrientes, crescer e produzir como a que vive sem problemas de obstáculos físicos. Pode-se concluir que uma planta vivendo em solo com alta resistência sofrerá séria restrição ao crescimento quando o suprimento de água e nutrientes for escasso.

 

           Em casa de vegetação Rosolem et al. (1994) quantificaram o aumento no raio médio de raízes de milho submetidas a quatro densidades diferentes (Tabela abaixo). Constatou-se que, na camada compactada (15-18,5 cm), o comprimento das raízes foi de cinco a dez vezes menor que na camada superficial (0-15 cm). Entretanto, não houve diferenças na absorção de nitrogênio, fósforo, potássio, cálcio e magnésio nos diferentes níveis de compactação, devido, segundo os autores, aos valores semelhantes de superfície de absorção radicular, tanto na menor quanto na maior densidade do solo.

 

Raio médio, comprimento e superfície radicular do milho, em função da densidade da camada subsuperficial (15 - 18,5 cm) de um latossolo vermelho-escuro textura média (adaptado de Rosolem et al., 1994)

Densidade Raio médio Comprimento** Superfície radicular**
cm cm cm
0 - 15 15 - 18,5 0 - 15 15 - 18,5 0 - 15 15 - 18,5
Kg.dm-3 mm cm cm2
1,03   0,23a*   0,16b 955 175 125 135
1,25   0,20a   0,14b 1220 220 145 150
1,48   0,24a   0,18ab 1390 148 185 147
1,72   0,21a   0,23a 2330 105 290 125

* Médias seguidas da mesma letra para raio médio na coluna, não diferem entre si, pelo teste de Tukey, ao nível de 5%;
** Valores obtidos por extrapolação, a partir das figuras de Rosalem et al. (1994), não tendo, portanto, a análise estatística.

 

         O efeito do tamanho dos agregados no crescimento de raízes de milho - em um luvisol cultivado há quinze anos com pastagem, tendo água e nutrientes como fatores não limitantes - é mostrado na próxima tabela. O menor agregado tinha 1,6 mm de diâmetro e os demais eram múltiplos do primeiro (3,2; 6,4; 12,8 mm). O comprimento total das raízes foi significativamente menor nas três classes de agregados maiores que na classe de menor tamanho (< 1,6 mm). Observou-se que o comprimento das raízes laterais secundárias e a participação delas no total das raízes foram maiores no menor agregado (Donald et al., 1987), refletindo num maior peso da parte aérea e numa maior área foliar.

 

Comprimento de raízes de milho cultivado em um luvisol com diferentes tamanhos de agregados (Donald et al., 1987)

Tamanho do agregado

Raiz principal Raízes laterais Comprimento total
Primárias Secundárias
Comprimento % do total Comprimento % do total Comprimento % do total
mm cm/vaso
< 1,6 136b* 1,3b 1014 9,4 9496a 88,4a 10735a
1,7 a 3,2 199b 2,6b 1157 15,0 6270ab 81,3ab 7712b
3,3 a 6,4 268b 3,7b 1168 16,3 5624b 78,7ab 7147b
6,5 a 12,8 633a 10,0a 1368 21,6 4183b 66,2b 6317b
* Médias sem letras ou seguidas pela mesma letra, na vertical, não diferem entre si, ao nível de 5%.

 

Efeitos mecânicos em condições de campo

 

         Em condições de campo, a raiz da planta pode se desenvolver em solos cujo arranjamento espacial de partículas sólidas e vazios seja uniforme ou naqueles cuja estrutura sofra descontinuidade. A porcentagem de espaços vazios no volume do solo e, especialmente, seus aspectos geométricos, como número, tamanho, forma, distribuição, direção, continuidade e conexão são bastante relevantes para o desenvolvimento radicular (Magalhães, 1990).

 

A) Solos com estrutura uniforme

 

         Se os solos não têm poros contínuos maiores que o diâmetro da raiz, ela se desenvolverá dependendo da resistência que lhe for imposta. Em estudo com o amendoim, foi mostrado que a taxa de elongação radicular diminuiu com a resistência do solo em torno da raiz, medida como a resistência ao penetrômetro de impacto. A elongação, quando não havia resistência, foi de 2,7 mm.dia-1 e com resistência, de 2,0 MPa, a elongação caiu a 1,29 mm.dia-1 (Taylor & Ratliff, 1969).

 

          Desde que haja poros suficientemente grandes, as raízes podem se desenvolver em solos com alta resistência (Wiersum, 1957 e Aubertin & Kardos, 1965). A presença dos macroporos permite às raízes atravessarem camadas de solos que seriam normalmente impenetráveis e terem acesso a um reservatório maior de água e nutrientes móveis. Os macroporos não são apenas fisicamente diferentes dos demais poros, pois podem ser ricos em microrganismos, sendo as raízes que neles crescem beneficiadas de várias maneiras, através de simbioses com liberação de nutrientes (Passioura, 1991).

 

          Muitas raízes laterais podem se proliferar numa planta se desenvolvendo em solo com poros menores que o diâmetro da raiz principal. Sendo assim, os dois tipos de raízes, num mesmo tempo, poderão estar explorando volumes de solos que apresentem condições diferentes de umidade, nutrientes ou mesmo toxicidade. Prevalecendo condições adversas para o pleno desenvolvimento das raízes, poderá haver absorção deficiente de água e nutrientes, com prejuízos para o crescimento da planta.

 

         Quando um solo é compactado, o diâmetro dos poros grandes é reduzido, a resistência mecânica aumenta e a aeração pode-se tornar deficiente. Estes três fatores podem agir de maneiras diferentes para cada situação (Boone et al., 1985), sendo feitos experimentos para discriminar cada um deles, o que, no campo, muitas vezes se mostra muito difícil. A próxima figura mostra - para dois tipos de solo, sob floresta e sob cultivo, em três níveis de compactação (densidade natural; compactação até ds = 1,25 kg.dm-3 e compactação até ds = 1,45 kg.dm-3) - que ao aumentar a densidade do solo, houve aumento dos poros com diâmetro menor que 0,05 mm, à custa da diminuição dos poros com diâmetro maior que este valor (Silva et al., 1986).

 

Porcentagem de poros nos três níveis de compactação (0 = densidade natural; 1 = 1,25 e 2 = 1,45 kg.dm-3), para o latossolo roxo argiloso (LR) e para o latossolo vermelho-amarelo textura média (LV): a = com diâmetro > 0,05 mm e b = com diâmetro < 0,05 mm (Silva et al., 1986)

 

          Taylor & Gardner (1963) mostraram que a penetração radicular diminuiu com o aumento da densidade para um determinado potencial da água no solo e determinaram que, a uma mesma densidade, a penetração diminui com a diminuição da umidade. Cogitou-se que a resistência mecânica do solo era uma causa muito maior das alterações na penetração da raiz que a densidade. De fato, a diminuição no conteúdo de água aumenta a resistência do solo, fazendo com que as raízes em expansão experimentem um impedimento mecânico cada vez maior.

 

Efeito da densidade do solo e do potencial da água (MPa) na penetração de raízes de algodoeiro (adaptada de Taylor & Gardner, 1963)

 

          Há que se ressaltar que o impedimento mecânico não é a única maneira pela qual a umidade influi no crescimento radicular em solos compactados. A concentração de oxigênio também tem efeito no crescimento radicular em níveis baixos de compactação (Hopkins & Patrick, 1970). Entretanto, a níveis altos, a concentração do oxigênio tem pouca influência, visto ser a resistência mecânica que praticamente controla o crescimento das raízes.

 

B) Solos com descontinuidades estruturais

 

         Os solos não apresentam, normalmente, vazios de tamanho e formas uniformes, mas sim descontinuidades estru­turais dentro do seu perfil, as quais constituem ambientes bem diferentes à expansão radicular. Assim, podem apresentar rachaduras verticais, unidades estruturais muito desenvolvidas e camadas horizontais altamente endurecidas (pans). Rachaduras verticais são planos verticais de fraqueza na massa do solo que, apresentando resistência zero ao crescimento, causam uma concentração radicular nessa região. Unidades estruturais altamente desenvolvidas podem apresentar um padrão de densidade e aeração diferente da massa do solo, po­dendo motivar um crescimento radicular distinto entre as unidades e dentro das unidades.

 

Resposta das plantas a compactação do solo

 

        A resposta à compactação das principais plantas cultivadas ainda é um campo que permanece cheio de dúvidas. Uma revisão razoável para milho, tomate, batata, beterraba e algodão foi feita por Rosenberg (1964). Notou-se que uma leve compactação foi benéfica às culturas, quando comparada ao solo extremamente solto e desagregado. Entretanto, em níveis mais elevados, a compactação promoveu efeitos prejudiciais às plantas, tais como germinação e brotação mais lentas, redução no estande, menor peso e altura por planta e menor produção por área.

 

        A identificação dos efeitos da compactação sobre as culturas é difícil, mas podem ser atribuídos a uma aeração pobre e à resistência mecânica ao desenvolvimento das raízes em solos muito densos e à baixa disponibilidade de água e nutrientes em solos pouco densos. Nenhuma relação geral pode ser feita entre dependência do crescimento da planta e condições físicas do solo. Entretanto, pode-se admitir, gene­ricamente, que existe uma relação parabólica entre produção de plantas e densidade do solo. Essa relação parabólica pode ser expressa da seguinte maneira:

 

PRM - P - C (DM - DA)2                  (10)

 

        em que PRM = produção relativa máxima da planta num dado solo em determinadas condições de tempo a uma densidade DM; P = produção atual da planta; DM = densidade média ótima de 10 a 40 cm de profundidade; DA = densidade do solo e C = constante que provavelmente depende da planta e do clima (Rosenberg, 1964). Abaixo de uma densidade crítica, as variações de produção são devidas a outros fatores que não as condições físicas do solo.

 

        Observou-se num alfissolo arenoso com baixo teor de matéria orgânica e com predomínio de caulinita na fração argila que, nas condições de sequeiro, as massas de panículas e raízes de arroz foram estatisticamente iguais, em diferentes densidades do solo. Mas, no arroz irrigado, as massas aumentaram progressivamente com o aumento da densidade até 1,6 kg.dm-3, diminuindo em densidades maiores que esta (Ogunremi, 1991).

 

         Whisler et al. (1993) estudaram o efeito da compactação causada por equipamentos pesados, na produção de algodão, em diversas regiões dos Estados Unidos. Nesse estudo, foi aplicado o modelo de Gupta & Allmaras (1987), que estima a densidade de solos de diferentes texturas e conteúdos de água, sob várias pressões aplicadas e várias áreas de contato, em função da profundidade e distância da banda de rodagem.

 

          Empregou-se, também, o programa GOSSYM (Reddy & Barker, 1989): um modelo de simulação, cuja principal ca­racterística é predizer a produção de algodão, utilizando dados de clima, propriedades físico-hídricas do solo e práticas culturais. Na Carolina do Sul, o aumento da densidade do solo (que chegou a 2,0 kg.dm-3) e o decréscimo da porosidade total provocaram diminuição na produção e na absorção de nitrogênio. Por outro lado, em outro local, no Texas, os modelos previram maior produtividade com o aumento da densidade do solo. Foi constatado, em ambos os experimentos, que as áreas com menor produtividade tinham mais raízes, devido ao maior período de estresse durante o enchimento das maçãs, resultando num maior transporte de fotossintetizados para as raízes, em detrimento da parte aérea.

 

Fases do solo que afetam o crescimento radicular

 

         As raízes raramente encontram, nos campos cultivados, um ambiente ótimo para seu desenvolvimento. O que encontram, frequentemente, são zonas dentro do volume de solo que as impedem de desenvolver plenamente seu potencial genético.

 

         Ainda que se considere o tamanho e a continuidade do sistema poroso fatores até mais importantes que a densidade e a resistência mecânica do solo à penetração (Trouse Jr., 1978), pode-se encontrar, no campo, uma das sete condições descritas a seguir, as quais representam as fases do solo que afetam o crescimento radicular:

 

Fase A: solo com sistema amplo de macroporos permitindo fácil penetração radicular e boa permeabilidade ao ar e à água;


Fase B:
solo comprimido o suficiente para reduzir um pouco o volume dos macroporos e causar uma pequena
redução na elongação radicular;


Fase C: o tamanho dos macroporos é bem mais reduzido que na fase anterior, a resistência do solo aumenta e o fluxo de ar é prejudicado. A elongação é diminuída, assim como a distribuição de raízes finas;


Fase D:
o tamanho e a continuidade dos poros são seriamente reduzidos, sendo a elongação radicular diminuída pela metade, comparada àquela na fase A. A ramificação das raízes é reduzida e tende a se desenvolver nas fraturas existentes ao longo dos planos de fraqueza do solo;


Fase E:
embora algumas raízes possam se desenvolver neste solo, a maioria o faz pelos planos de fratura. Normal­mente, uma raiz grande se desenvolve entre planos de fratura e comprime o solo ao seu redor de tal maneira que as ramificações não conseguem penetrá-lo, ficando no canal radicular;


Fase F:
apenas algumas poucas raízes conseguem penetrar a camada de solo nesta fase, e as que conseguem não têm elongação maior que poucos milímetros por dia. A maioria delas se desviam ou ficam confinadas aos planos de fratura;


Fase G:
o crescimento da raiz é totalmente impedido.

 

Outros efeitos

 

          Além dos efeitos nos atributos físicos do solo, observa-se que a compactação pode predispor o ambiente a algumas injúrias normalmente não esperadas e devidas a herbicidas, fungicidas ou inseticidas. O efeito da compactação nas injúrias causadas por herbicidas de longo efeito residual, como a trifluralina, pode ajudar a explicar os sintomas que aparecem em plantas cultivadas em rotação, quando o herbicida foi utilizado na cultura anterior para controle de gramíneas. Se o preparo do solo para o plantio de cultura em sucessão for realizado em condições de solo úmido, o que pode ocorrer num ano em que as chuvas atrasem, e o cronograma de execução das operações agrícolas não podendo ser seguido à risca, o solo pode ficar compactado e os sintomas de fitotoxicidade pelo herbicida podem aparecer. Se, por outro lado, o solo tivesse sido preparado em condições favoráveis de umidade, uma mesma dose residual do produto não teria causado injúrias ao sistema radicular da cultura.

 

          Martin et al. (1985) examinaram a influência da compactação de um alfissolo na atividade da trifluralina, concluindo que à medida que a densidade do solo foi aumentada, de 110 para l ,50 e 1,66 kg.dm-3, houve aumento na porcentagem de raízes com ponta intumescida e diminuição no número e no comprimento de raízes secundárias nas duas doses do herbicida (0,38 e 0,79 mmol.kg-1). Observou-se, na, menor dose do produto, que o número de raízes secundárias caiu de 72 para 57%, e o comprimento dessas raízes caiu de 59 para 46%, na densidade 1,66 kg.dm-3 em relação a dose zero de trifluralina, na menor densidade do solo (Tabela abaixo).

 

Efeito da compactação sob a semente e da trifluralina no crescimento de plântulas de milho (adaptada de Martin et. al., 1985)

Densidade do solo Dose de trifluralina (mmol.kg-1)
0 380 790

kg.dm-3

Raízes com ponta entumescida (% do total)

1,1 0 16 41
1,5 0 16 41
1,6 9 32 47

Número de raízes secundárias* (%)

1,1 100 72 50
1,5 76 62 48
1,6 62 57 46

Comprimento de raízes secundárias (%)

1,1 100 59 53
1,5 85 48 47
1,6 62 46 44
*  % em relação a dose zero de trifluralina e densidade do solo = 1,1 kg.dm-3.

 

          A compactação pode aumentar também a severidade de sintomas de algumas doenças. Quando as condições ambientes previnem a expressão total das doenças, a compactação pode ajudar a diferenciar cultivares resistentes de suscetíveis.  Um exemplo clássico é a podridão das raízes de soja, causada por Phytophtora megasmperma f.sp. glycinea, cuja j incidência aumenta enormemente em solos compactados (Fulton et al., 1961). Moots et al. (1988) notaram que o aparecimento da podridão e o número de plantas mortas aumentou com a compactação de um molissolo, enquanto a massa das sementes e o número de plantas emergentes diminuiu. Em um dos anos avaliados, 1983, os autores notaram que no solo não compactado, apenas uma cultivar, considerada suscetível, teve uma incidência da doença significativamente superior às outras cultivares. Por outro lado, no solo compactado, a doença se manifestou também em outra cultivar suscetível.

          Na região tropical, na qual predominam solos com argila de baixa atividade, ou seja, onde é pouco freqüente o fenômeno de expansão e contração em períodos de umedecimento e secamento e onde não ocorre congelamento dosolo em algum período do ano, uma camada compactada localizada em grandes profundidades pode ser considerada permanente.

 

Persistência da compactação

 

          Uma camada compactada é mais persistente quanto maior for a profundidade em que ela se encontra. Dependendo de fatores pedogenéticos do solo (expansão e contração de argilas do grupo 2:1), fatores climáticos (congelamento e degelo), atividade biológica de microrganismos e sistema de manejo adotado, há variação na persistência da compactação nos solos (Hakansson & Reeder, 1994).

 

          A próxima figura mostra como a compactação, em diferentes camadas do solo, causada por veículos pesados, afeta a produção das culturas em função do tempo.

 

Diagrama mostrando o efeito da compactação causada pelo tráfego de veículos pesados no decréscimo da produção das culturas, estando a camada compactada em diferentes profundidades de um solo franco-argiloso(adaptada de Hakansson & Reeder, 1994)

 

          Três componentes podem ser distinguidos na figura acima. Na reta (a), a compactação ocorreu na camada arável, de 0 a 25 cm de profundidade. Este componente é altamente dependente do teor de argila do solo, assumindo-se que o efeito prejudicial da compactação nesta camada decresce linearmente com o tempo e desaparece em cinco anos. A reta (b) origina-se da compactação na parte superior do chamado subsolo (26-40 cm), sendo, para este componente, assumido também um decréscimo linear completamente aliviado em 10 anos, apesar de supor sua permanência por mais tempo, em solos de textura média. De acordo com o modelo, a compactação causada a profundidades maiores que 40 cm é considerada permanente, embora nesse caso, ela ocasione menores perdas na produção das culturas, quando comparada à camada compactada localizada nos primeiros 25 cm. Entretanto, em condições de veranico, quando as raízes necessitam explorar um maior volume de solo, os prejuízos podem ser grandes, caso o solo compactado em subsuperfície impeça o pleno desenvolvimento do sistema radicular.

 

LITERATURA CITADA

 

ASADY, G.H.; SMUCKER, A.J.M. & ADAMS, M.W. Seedling test for the quantitative measurement of root tolerances to compacted soil. Crop Sec., Madison, 25:802-806, 1985.

 

AUBERTIN, G.M. & KARDOS, L.T. Root growth through porous media under controlled conditions. I. Effect of pore size and rigidity. Soil Sei. Soe. Am. Proc., Madison, 29:290-293,1965.

 

BARLEY, K.P. The effects of mechanical stress on the growth of roots. J. Exp. Bot, Oxford, 13:95-110, 1962.

 

DONALD, R.G.; KAY, B.D. & MILLER, M.H. The effect of soil aggregate size on early shoot and root growth of maize (Zea mays L.). Plant Soil, Dordrecht, 103:251-259, 1987.

 

FULTON, J.M.; MORTIMORE, C.G. & HILDEBRAND, A.A. Note on the relation of soil bulk density to the incidence of phytophthora root and stalk rot of soybeans. Can. J. Soil Sci., Ottawa, 41:247, 1961.

 

GOOS, MJ. Effects of mechanical impedance on root growth in barley (Hordeum vulgaris L.). I. Effects on elongation and branching of seminal roots. J. Soil Sei., London, 28:96-111, 1977.

 

GUPTA, S.C. & ALLMARAS, R.R. Models to assess the susceptibility of soils to excessive compaction. Adv. Soil Sei., New York, 6:65-100, 1987.

 

HAKANSSON, I. & REEDER, R.C. Subsoil compaction by vehicles with high axle-load extent, presistence and crop response. Soil Till. Res., Amsterdam, 29:277-304, 1994.

 

HOPKINS, R.M. & PATRICK, W.H. Combined effect of oxygen concentration and soil compaction on root penetration. Soil Sei., Baltimore, 108:408-413, 1970.

 

MAGALHÃES, RS.G. Manejo do solo e seus efeitos sobre a compactação. In: SILVEIRA, G.M. da, coord. CICLO DE ESTUDOS SOBRE MECANIZAÇÃO AGRÍCOLA, 4., Jundiaí, 1990. Anais. Campinas, Fundação Cargill, 1990. p. 157-167.

 

MARTIN, A.G.; JORDAN, TN. & STEINHARDT, G.C. Influence of soil compaction on trifluralin phytotoxicity to corn. Agron. J., Madison, 77:481-483, 1985.

 

MOOTS, C.K.; NICKELL, C.D. & GRAY, L.E. Effects of soil compaction on the incidence of Phytophtora megasperma f. sp. glycinea in soybean. Plant Dis., St. Paul, 72:896-900,1988.

 

OGUNREMI, L.T. Influence of bulk density and moisture regime of a permeable soil on the performance of a lowland rice. Oryza sativa L. Trop. Agric., Trinidad, 68:129-134, 1991.

 

PASSIOURA, J.B. Soil structure and plant growth. Austr. J. Soil Res., Melbourne, 29:717-728, 1991.

 

ROSENBERG, N.J. Response of plants to the physical effects of soil compaction. Adv. Agron., New York, 16:181-196,1964.

 

REDDY, V.R. & BAKER, D.N. Application of GOSSYM to analysis of the effects of wheather on cotton yields. Agric. Sys., Edimburgh, 32:83-95, 1989.

 

ROSOLEM, C.A.; VALE, L.R.; GRASSI FILHO, H. & MORAES, M.H. Sistema radicular e nutrição do milho em função da calagem e da compactação do solo. R. bras. Ci. Solo, Campinas, 18:491-497, 1994.

 

RUSSEL, R.S. Plant root systems: their function and interactions with the soil. Meidenhed. McGraw-Hill, 1977. 298p.

 

RUSSEL, R.S. & GOSS, MJ. Physical aspects of soil fertility. The response of roots to mechanical impedance. Neth. J. Agric. Sei., Wageningen, 22:305-318, 1974.

 

SILVA, A.P.; LIBARDI, P.L. & CAMARGO, O.A. Influência da compactação nas propriedades físicas de dois latossolos. R. bras. Ci. Solo, Campinas, 10:91-95, 1986.

 

TAYLOR, H.M. & GARDNER, H.R. Penetration of cotton seedling taproots as influenced by bulk-density, moisture content and strength of soil. Soil Sec., Baltimore, 96:153-156, 1963.

 

TAYLOR, H.M. & RATLIFF, L.F. Root elongation rates of cotton and peanuts as a function of soil strength and soil water content. Soil Sei., Baltimore, 108:113-119, 1969.

 

TROUSE JR., A.C. Root tolerance to soil impediments. In: Crop tolerance to subtropical land conditions. Madison, ASA/ CSSA/SSSA, 1978. p. 193-232.

 

WIERSUM, L.K. The relatioship of the size and structural rigidity of pores to their penetration by roots. Plant Soil, The Hague, 9:75-85, 1957.

 

WHISLER, F.D.; REDDY, V.R.; BAKER, D.N. & McKINíON, J.M. Analysis of the effects of soil compaction on cotton yield trends. Agric. Sys., Edinburgh, 42:199-207, 1993.

 

Reprodução autorizada desde que citado o autor e a fonte

Otávio Antonio de Camargo, formado em engenharia agronômica (1967) e mestre em Agricultura (1972) pela Esalq-USP e PhD pela Universidade da California (1978).
É pesquisador do IAC desde 1969 (atualmente nível VI), professor colaborador da Esalq-USP desde 1990 e bolsista de produtividade do CNPq desde 1970. Já foi do Comitê externo de avaliação de diversos Centros e de programas da Embrapa e do CNPq. Tem diversos livros, capítulos de livros e boletins editados e é autor de aproximadamente uma centena de artigos científicos em revistas nacionais e internacionais. É editor associado da Revista Brasileira de Ciência do Solo desde 1979, revisor de diversas revistas nacionais e internacionais e assessor científico da FAPESP e do CNPq, entre outras agências financeiras, desde 1980.
Contato:Otávio Camargo


Luís Reynaldo Ferracciú Alleoni, formado em engenharia agronômica, (1985), mestre (1992) e doutor (1996) em Agronomia, Área de Concentração: Solos e Nutrição de Plantas, e Livre-Docente em Química do Solo (2000), todos pela ESALQ/USP, além de Pós-Doutorado na Universidade da Florida (2005-2006). Trabalhou como pesquisador científico no Centro de Tecnologia da  Copersucar e no Instituto Agronômico de Campinas, e como docente na Fundação Faculdade de Agronomia Luiz Meneghel (Bandeirantes- PR) e na Universidade de Marília. É professor da Departamento de Solos e Nutrição de Plantas da ESALQ/USP desde 1997 e bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq desde 1998. É Editor-Chefe da revista Scientia Agricola e é autor de aproximadamente 50 artigos  científicos em revistas nacionais e internacionais. É assessor científico da FAPESP e do CNPq, entre outras agências financeiras, desde 1999.

 


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

CAMARGO de, O. A.; Alleoni, L.R.F. Efeito da compactação no crescimento de plantas. 2006. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2006_2/C5/Index.htm>. Acesso em:


Publicado no InfoBibos em 21/07/2006

imprimir

Envie para um amigo


Veja Também...